Reparai como o Senhor os atrai e exorta, pelo modo de interrogar. Não perguntou: ‘Podeis suportar os suplícios? Podeis derramar vosso sangue?’, mas indagou: ‘Por acaso podeis beber o cálice…?’ E para os estimular, ainda acrescentou: ‘[…o cálice] que Eu vou beber?’ Assim falava para que, em união com Ele, se tornassem mais decididos. Chama sua Paixão de ‘Batismo’, para dar a entender que os sofrimentos haviam de trazer uma grande purificação para o mundo inteiro. Então os dois discípulos lhe disseram: ‘Podemos’ [Mateus 20,22]. Prometem imediatamente, cheios de fervor, sem perceber o alcance do que dizem, mas com a esperança de obter o que pediam.
O que afirma o Senhor? ‘De fato, vós bebereis do Meu cálice’ [Mateus 20,23], ‘e sereis batizados com o Batismo com que Eu devo ser batizado’ [Marcos 10,39]. Grandes são os bens que lhes anuncia, a saber: ‘Sereis dignos de receber o martírio e sofrereis comigo; terminareis a vida com morte violenta e assim participareis da Minha paixão’. ‘Mas não depende de Mim conceder o lugar à minha direita ou à minha esquerda. Meu Pai é quem dará esses lugares àqueles para os quais Ele os preparou’ [Mateus 20,23]. Somente depois de lhes ter levantado os ânimos e de tê-los tornado capazes de superar a tristeza é que corrigiu o pedido que fizeram.
‘Então os outros dez discípulos ficaram irritados contra os dois irmãos’ [Mateus 20,24] – Vedes como todos eles eram imperfeitos, tanto os que tentavam ficar acima dos outros, como os dez que tinham inveja dos dois? Mas, como já tive ocasião de dizer, observai-os mais tarde e vereis como estão livres de todos esses sentimentos. Prestai atenção como o mesmo Apóstolo João, que se adianta agora por este motivo, cederá sempre o primeiro lugar a Pedro, quer para usar da palavra, quer para fazer milagres, conforme se lê nos Atos dos Apóstolos. Tiago, porém, não viveu muito mais tempo. Desde o princípio, pondo de parte toda aspiração humana, elevou-se a tão grande santidade que bem depressa recebeu a coroa do martírio” (Homilia 65,2-4; PG 58,619-622).