Por Rafael Vitola Brodbeck
SACRIFÍCIO CRUENTO E INCRUENTO
Por causa do pecado, a humanidade se afastou de Deus. E Ele não tinha obrigação nenhuma de perdoar o erro cometido. Se o fez, foi por amor.
“Com efeito, Deus amou tanto o mundo que ofereceu Seu Filho Unigênito para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna.” (Jo 3,16)
Como, porém, Jesus se ofereceu para dar a vida a todo aquele que crer? Sabemos que o salário do pecado é a morte (cf. Rm 6,23). Bem claras são as palavras do Apóstolo:
“Eis por que, assim como por um só homem o pecado entrou no mundo, e pelo pecado, a morte e assim a morte atingiu todos os homens: aliás todos pecaram… pois, até à lei, o pecado estava no mundo e, embora o pecado não possa ser sujeito a sanção quando não há lei, no entanto, de Adão a Moisés a morte reinou, mesmo sobre os que não tinham pecado por uma transgressão idêntica à de Adão , figura daquele que havia de vir.
Mas não acontece com o dom da graça o mesmo que com a falta; pois, se pela falta de um só a multidão sofreu a morte, com muito maior razão a graça de Deus, graça concedida em um só homem, Jesus Cristo, derramou-se em abundância sobre a multidão. E também não acontece com o dom o mesmo que com as conseqüências do pecado de um só: com efeito a partir do pecado de um só, o julgamento conduz à condenação, ao passo que a partir de numerosas faltas, o dom da graça conduz à justificação. Pois se por um só homem, pela falta de um só, reinou a morte, com muito maior razão, pelo único Jesus Cristo , reinarão na vida aqueles que recebem a abundância da graça e do dom da justiça. Em suma, assim como pela falta de um só sucedeu para todos os homens a condenação, assim pela obra de justiça de um só sucede para todos os homens a justificação que dá a vida. De fato, assim como, pela desobediência de um só homem, a multidão se tornou pecadora, assim também, pela obediência de um só, a multidão se tornará justa.” (Rm 5,12-19)
Adão, pecando, trouxe a morte ao mundo. Jesus, o novo Adão, morrendo, tirou o pecado do mundo. Ele é o Agnus Dei, qui tollit peccata mundi. Pela morte de Cristo, Seu sacrifício expiatório, temos a paz com Deus, para o adorarmos eternamente.
“Ele nos predestinou a ser para ele filhos adotivos por Jesus Cristo, assim o quis a sua benevolência para o louvor da sua glória, e da graça com que nos cumulou em seu Bem-amado: nele, por seu sangue, somos libertados, nele, nossas faltas são perdoadas, segundo a riqueza da sua graça .” (Ef 1,5-7)
“Mas agora, em Jesus Cristo , vós que outrora estáveis longe, fostes tornados próximos pelo sangue de Cristo.” (Ef 2,13)
“(…) eleitos segundo os desígnios de Deus Pai , pela santificação do Espírito, para obedecer a Jesus Cristo e ter parte na aspersão de seu sangue.” (I Pe 1,.2)
“(…) o sangue de Jesus, seu Filho, purifica-nos de todo pecado.” (I Jo 1,7)
Os protestantes crêem, como nós, no sacrifício expiatório de Jesus Cristo, como causa para o perdão de nossos pecados. Todavia, eles, em sua Santa Ceia, apenas comemoram esse sacrifício. Nós, ao nos lembrarmos, deixamos com que o Espírito Santo torne, através do sacerdote, realmente presente o único e eterno sacrifício que nos garantiu a redenção. Pois, como diz a Escritura, “ao nosso Sumo-sacerdote, entretanto, compete ministério tanto mais excelente quanto ele é mediador de uma aliança mais perfeita, selada por melhores promessas.” (Hb 8,6)
Todo sacrifício se reveste de quatro finalidades. A primeira é a adoração. No sacrifício da Missa, vimos, estamos adorando a Deus na presença de toda a Igreja, do céu e da terra. Ao redor do trono do Senhor, nos prostramos e reconhecemos que Ele é rei.
A segunda finalidade é ação de graças, o agradecimento a Deus, de onde, como já dissemos, vem a palavra eucaristia.
A impetração ou petição, é o terceiro fim do sacrifício. Pedimos ao Senhor que nos dê Sua graça, estenda Sua bondade a todos nós e nos cumule com toda a sorte de bênçãos, espirituais e materiais, e sobretudo, nos dando a santidade que Ele espera de nós.
Finalmente, temos o caráter propiciatório do sacrifício, que nos reconcilia com Deus, aplaca Sua ira, perdoa nossos pecados e nos faz cidadãos do Reino de Cristo.
Na Cruz, Jesus adorou o Pai mediante Sua submissão e completa obediência. Também agradeceu por Sua missão na terra ter sido cumprida. Não nos esqueçamos, porém, que no Seu sacrifício, Ele pediu a Deus que fôssemos perdoados, e, estendendo os braços, traçou o sinal da Aliança entre o céu e a terra, expiando por nossas faltas.
Em sua forma cruenta, o único e eterno sacrifício da Cruz cumpriu todas as quatro finalidades. Na Missa, onde o mesmo sacrifício se dá de uma forma incruenta, também esses quatro objetivos são cumpridos. O Missal Romano, em nosso rito latino, estabelece os atos, orações, vasos e vestimentas apropriados, com o intuito de nos lembrar de cada uma dessas finalidades e, assim, tomarmos consciência de que estamos diante de um sacrifício verdadeiro, que nos dá infinitos frutos, dentre os quais, destacamos, a santidade e o gosto pelas coisas de Deus.
Na Missa, no rito romano, o padre reza, após o Ofertório:
“Orate, fratres, ut meum ac vestrum sacrificium acceptabile fiat apud Deum Patrem omnipotentem.”
Ao que é acompanhado dos fiéis:
“Suscipiat Dominus sacrificium de manibus tuis, ad laudem et gloriam nominis sui, ad utilitatem quoque nostram, totiusque Ecclesiae suae sanctae.”
Sim, a Missa é um verdadeiro sacrifício, e não uma simples reunião de oração. E, num sacrifício, temos uma vítima e um sacerdote. No sacrifício cruento, Cristo se entregou como vítima em expiação de nossos pecados, e foi o Sumo Sacerdote, realização dos ritos vétero-testamentários.
Na Missa, Cristo ainda é a vítima, sob as aparências de pão e vinho. E ainda é o Sumo Sacerdote, pelo qual age o padre – diz-se que o celebrante age in persona Christi.
Jesus Cristo: vítima e sacerdote!
“Ó Cordeiro de Deus, que Vos entregastes por nós. Ó imolado Redentor, que oferecestes Vós mesmo a Vosso Pai. Ó Vítima agradável que fostes de Vós mesmo o Pontífice sacrificador.” (Oferecimento da Vítima, Santa Missa em Rito Maronita)