Pode o Cristão receber carismas diretamente do Espírito Santo?

Por Alessandro Lima

Uma das grandes questões levantadas nos círculos cristãos é se o cristão pode ou não receber carismas diretamente do Espírito Santo sem necessitar da Igreja. Isto é, se pode ou não ser guiado diretamente pelo Espírito Santo sem assim necessitar do Magistério da Igreja, se pode ou não receber os dons do Espírito Santo e o Ministério Eclesiástico sem o intermédio da Igreja.

Se Deus o permitir, gostaria de colocar um pouco de luz sobre este assunto.

A Sagrada Escritura dá testemunho que em tempos muito remotos Deus costumava conversar com os homens. Tal era o caso de Adão (cf. Gn 1,28-30; 2,16-17; 3,9.11.17-19) e seu Filho Caim (cf. Gn 4,6-7.9-12.15). Aliás eram os únicos homens na terra e só poderiam ser orientados pelo Senhor através Dele mesmo.

Quando a terra começa ficar populosa, o Senhor confia seus oráculos somente a poucos homens, para que sejam sinais, testemunhas e guia do Senhor para o resto da humanidade. Este novo passo da revelação Divina aos homens é iniciado com Noé (cf. Gn 6,13-21; 7,1-4; 8,15-17).

Depois de Noé, o Senhor não só continua a dar prosseguimento ao Seu Magistério, como também começa a preparar o caminho da salvação através de Abraão. E somente a ele confia sua revelação (cf. Gn 12,1-3.7; 13,14-17; 15; 17,1). Sagrada Escritura nos conta que o Senhor (Jesus Cristo) também apareceu a Agar (escrava de Sarai, mulher de Abraão, com a qual o Patriarca teve seu primeiro filho, Ismael) concedendo-lhe uma revelação por causa da sua aflição (cf Gn 16,7-14).

Alguns poderiam afirmar aí que a exemplo de Agar o Senhor pode nos guiar diretamente. Porém o Senhor que conhece o pensamento dos homens, para mostrar que seus oráculos não são confiados diretamente, mas sim através de um magistério legitimamente instituído, pede para que Agar volte depressa para a casa de Abraão, que é uma pré-figura da Igreja, pois era na casa de Abraão que naquele tempo estava presente o Magistério Divino.

Isto mostra que o Senhor pode revelar-se sim, das formas mais diversas e controversas possíveis, a qualquer um, em qualquer lugar e a qualquer tempo, porém Sua mensagem sempre nos exortará ir de encontro ao Seu Magistério, que é o Seu Sinal para todos os homens e de onde somente, podemos conhecer a Verdade.

Tal foi o caso do Apóstolo Paulo, que embora tenha recebido uma revelação direta do Senhor (cf. At 9,1-9; Gl 1,12), embora tivesse visto o Senhor ressuscitado, só pode dar início ao seu ministério após ter sido iniciado pela Igreja (cf. At 9,10-19); pois a Igreja é o sinal visível do Magistério Divino.

Ninguém pode se declarar dotados de dons espirituais e nem se declarar pastor do povo de Deus, sem que a Igreja tenha lhe dado tal carisma. Pois o ministério eclesiástico é ordenado (Lv 8,1-13; Dt 34,9; At 1,15-26; 6,1-6; 9,10-19; 1Tm 4,14; 2Tm 1,6; Tito 1,5) e o Espírito Santo é dado através dos Sacramentos da Igreja (cf. At 8,14-21; 19,13-19). Assim como o ministério eclesiástico fora dado para a Igreja (através dos apóstolos) diretamente por Deus na Pessoa de Jesus Cristo e daí por diante foi concedido a outros somente através das sucessões apostólicas, o mesmo acontece com os dons do Espírito Santo, que inicialmente fora dado para a Igreja por Deus na Pessoa do Espírito Santo (cf. At 2,1-13) e daí por diante somente foi concedido através da Igreja nos seus Sacramentos, conforme o leitor pode verificar nas referências bíblicas anteriormente citadas.

O Espírito Santo embora guiasse o Apóstolo Paulo orientando-o sobre o quê e onde deveria pregar, em uma revelação manda-o submeter seu Evangelho (sua pregação acerca da Boa Nova) ao Magistério da Igreja (cf. Gl 2,1-2). São Paulo sabia muito bem que a Igreja era o sinal Visível da Verdade (cf. 1Tm 3,15), tanto o sabia que foi a Jerusalém submeter seu Evangelho os outros Apóstolos, pois temia pregar ou ter pregado em vão (cf. Gl 2,2). Assim é a ação do Espírito Santo, sempre aponta para a Igreja, que é a única “Coluna e o Fundamento da Verdade” (cf. 1Tm 3,15).

E disto bem sabiam aqueles que amaram o Senhor antes de nós, pois sempre procuravam ser fiéis ao Magistério da Igreja (cf. At 16,4-5).

Porém, não eram todos. A exemplo de hoje, ainda nos tempos tempos apostólicos, aqueles que se julgavam dotados de dons espirituais, achavam que o Espírito Santo os guiava diretamente, e conseqüentemente acabavam ignorando o Magistério da Igreja. Tal era o caso dos cristãos em Corinto. Os coríntios eram dotados de todos os dons vindos do Espírito Santo (cf. 1Cor 1,4-6), no entanto o desprezo pelo Magistério da Igreja fez com que a baderna tomasse conta da Igreja.

São Paulo escreve sua epístola para intervir nesta comunidade, e prescreve várias normas de fé, além de regras morais e disciplinares (Caps 1-11, 15-16). Nos capítulos 12 a 14, o Santo Apóstolo ensina como os coríntios deveriam administrar os carismas recebidos pelo Espírito Santo. Ora, se o Espírito Santo guiasse diretamente os fiéis, não haveria a necessidade do Apóstolo prescrever tais instruções, já que a Igreja de Corinto era farta em carismas (cf. 1Cor 1,4-6).

Para aqueles que se julgam Pentecostais ou Carismáticos e verdadeiros conhecedores da Sagrada Escritura, saibam que a Escritura dá testemunho que aquele que realmente é tomado pelo Espírito Santo, sabe que é Este mesmo Espírito que confirma a Igreja na Verdade, sendo portanto imprescindível a fidelidade ao seu Magistério, pois tais são as palavras do Santo Apóstolo:

“Se alguém se julga profeta ou agraciado com dons espirituais, reconheça que as coisas que vos escrevo [o que ensina a Igreja] são um mandamento do Senhor. Mas se alguém quiser ignorá-lo, que o ignore!” (1Cor 14,37-38). Ver também 1Tess 5,12-13; Tito 1,7; 2,15; Filemon 1,8

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