Como dizia a praga, chinesa, vivemos em tempos interessantes. Estes são os tempos em que acontecem as coisas que são lembradas em livros de História: guerras, ditaduras, desastres… Os tempos desinteressantes, em que se vive pacificamente, nada têm que os faça memoráveis.
E, nestes nossos interessantíssimos tempos, ocorreu um episódio curioso que mostra bem a situação atual da política e da mídia no Brasil. A estação de tevê católica Canção Nova contratou e descontratou em tempo recorde nada menos que o presidente do PT de São Paulo para apresentar um programa.
Pelo que ouvi dizer, parece que o sujeito é um dos envolvidos na triste tentativa de calar a boca dos bispos que apontaram, na época da eleição, o fato de o PT ter a legalização do aborto em sua plataforma. Ora, não fizeram os bispos mais que seu dever. Se um partido tem uma posição definida, é mais que correto que esta posição seja conhecida, tanto pelos que a apoiam quanto pelos que lhe são contrários, e na Igreja compete aos bispos dar este tipo de orientação pastoral.
O fim do programa provavelmente se deve ao escândalo que causou, com farta mobilização das redes sociais, apelos a Roma e ao bispo local (aliás, uma das vítimas da tentativa de censura na época da eleição). Diplomaticamente, ao invés de um mea culpa público e uma demissão fragorosa, foram cortados todos os programas de pessoas que têm mandato eletivo, o dele inclusive.
A questão, contudo, é outra: que país é este, em que pode parecer uma boa ideia a uma emissora de televisão católica dar espaço em sua programação para alguém que prega o contrário do que prega a Igreja? Em que a presidência estadual do partido que ocupa o governo federal equivale a uma qualificação para ensinar o que não se sabe? Em que as emissoras comerciais apresentam tamanha quantidade de anúncios do governo federal pagos com os nossos impostos e frequentemente inúteis, como os anúncios milionários com o pretexto do Enem que sua perda súbita lhes causaria sérios problemas de caixa? Em que a fragilidade e arbitrariedade do sistema federal de concessões de telecomunicação faz com que uma emissora religiosa, que não transmite anúncios, se veja tentada a ganhar alguma estabilidade dando um programa a um político governista?!
O PT não conseguiu aprovar a Lei de Imprensa que propôs, mais restritiva que a do governo militar, mas está acabando com a liberdade da mídia pelas beiradas. Este é só mais um caso. São, realmente, tempos interessantes estes em que vivemos.
- Fonte: Gazeta do Povo