Parte i

PARTE I

 

TRADIÇÃO: SUPORTE DO PAPADO?

por Paulo Cristiano da Silva

” NÃO REFUTAREI APENAS AS ACUSAÇÕES LEVANTADAS CONTRA NÓS; FAREI COM QUE ELAS SE VOLTEM CONTRA SEUS PRÓPRIOS AUTORES ” (Tertuliano, 220 d. C.)



A IMPORTÂNCIA DA TRADIÇÃO NO CATOLICISMO

O Concilio de Trento define a tradição como o “conjunto de doutrinas reveladas referentes à fé e a moral, não consignadas nas Escrituras Sagradas, mas oralmente transmitidas por Deus à Igreja” (Sessão IV, de 8 de Abril de 1546)

“A Sagrada Tradição”, afirma O Concílio Ecumênico Vaticano II através de sua Constituição Dogmática Dei Verbum “a Sagrada Tradição…transmite integralmente aos sucessores dos apóstolos a Palavra de Deus confiada por Cristo Senhor e pelo Espírito Santo aos apóstolos…”

A teologia da idade Média escampada pelos Concílios Ecumênicos de Trento, do Vaticano I e do Vaticano II, impingiu a tese de que o consenso unânime dos pais da Igreja se constitui em legitima revelação. Ele é imprescindível e fundamental na Tradição.

A tradição é a fonte primordial de todas as doutrinas extrabíblica encontrada no bojo dogmático do catolicismo e o papado é uma delas. Por isso que somente após o concílio tridentino da contra-reforma, foi que apareceram as primeiras coleções de obras patrísticas – o primeiro órgão da Tradição – fazendo frente à reforma protestante levada a cabo por Martinho Lutero. Era necessário dar um status de autoridade à tradição a fim de dar suporte às heresias papais. O teólogo católico Van Iersel, em seu artigo: “O uso da Bíblia na Igreja Católica”, inserido no vol. V, de Temas Conciliares na página 17, confessa: “…em oposição à reforma deu-se um lugar à Tradição ao lado da Escritura, o que tornava muito relativo o valor da Bíblia”.(ênfase acrescentada)

Foi assim que a tradição ganhou força junto às Escrituras, sendo até mesmo superior a esta pois, “Pela mesma Tradição…as próprias escrituras são nela cada vez melhor compreendidas…” sublinha o Concílio Vaticano II.

Como era de se esperar, os protestantes, que já fazem uma miscelânia fenomenal ao “estudarem” a Bíblia, pisam feio na bola ao tentar abordar a Tradição Cristã.

Afinal, se eles deturpam um texto que eles mesmos têm por sagrado, imaginem o que não são capazes de fazer ao abordarem a Tradição, vista por eles como herética…

A primeira inverdade do trecho acima á a afirmação de que a Tradição Católica é a “fonte primordial” de todas as doutrinas extrabíblicas do catolicismo. O que eles chamam de “doutrinas extrabíblicas”, na imensa maioria dos casos, são doutrinas fortemente enraizadas na Bíblia. Ocorre que a miopia protestante não permite que os míopes as vejam.

Tomemos (como fizeram os protestantes do CACP) o papado, por exemplo. Há frases absolutamente certeiras e inequívocas no texto sagrado que o apóiam. Há o”tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a Minha Igreja”, de Mt 16, 18. Há o “apascenta as minhas ovelhas”, repetido três vezes pelo Mestre, para que qualquer um pudesse entender (Jo 21, 15-17). Há a lista dos apóstolos de Mt 10, 2 que afirma: “EM PRIMEIRO, Pedro; DEPOIS…”. Há o testemunho de São Paulo, de ter subido a Jerusalém para estar com Pedro. Há o testemunho de São Paulo de que Jesus apareceu primeiro a Pedro, depois aos aoutros.

Não bastassem estes exemplos, existem inúmeros outros que, indiretamente provam o primado de São Pedro sobre todos os apóstolos. O apologista norte-americano, Dave Armstrong, inclusive, elenca 50 provas bíblicas acerca do primado petrino (os interessados acessem http://web.archive.org/web/20030213005041/http://ic.net/~erasmus/RAZ112.HTM)

E, apesar disto, o texto do CACP afirma que o papado é uma doutria extrabíblica…

Insisto: se o texto que eles têm por sagrado, apesar de toda a clareza, não é capaz de convencê-los, imagine a impotência que a Tradição representa neste sentido.

Esta foi só a primeira bobagem que o trecho acima esposou. A outra (tão retumbante quanto esta) é a de que a Tradição teria ganho força a partir da Reforma Protestante. Inverdade maior não poderia haver.

A Tradição sempre foi respeitada e guardada pelos cristãos. A Bíblia já nos testemunha este fato Lc 1,1-2 , 1 Co 11, 2, 2 Te 2,15 e 3, 6, 2 Tm 1, 13-14 e 2, 2 além de outras passagens. Além disto, basta analisar a própria Tradição para se saber que a Tradição sempre foi guardada entre os católicos. Veja neste sentido o nosso artigo https://www.veritatis.com.br/article/916 .

Além da Bíblia e da própria, existe uma evidência história ainda mais pungente (e que, por óbvio, será igualmente desconsiderada pelos protestantes, na sanha de negarem todas as evidências do erro em que se encontram): a Igreja Ortodoxa separou-se de Roma em 1054 (quinhentos anos antes do Concílio de Trento). No entanto, os ortodoxos até hoje guardam a Tradição ao lado da Bíblia como sendo parte da Revelação.

Este fato, simplesmente, não tem explicação dentro da tese defendida pelo CACP.


MALOGRO ROMANISTA

A assertiva da cúria papal de que havia unanimidade e consenso de opinião entre os pais da igreja, tornou-se um tanto utópica, quando se constatou que só numa coisa êles concordavam: – é que discordavam em quase tudo.

Isto é mais uma das tolices da turma do CACP (haverá tantas ainda neste texto…). Qualquer pessoa que tenha estudado ainda que remotamente a patrística saberá que os pais da Igreja, substancialmente, concordavam em quase tudo. Havia entre eles pequenas diferenças de opinião, quando tais opiniões ainda encontravam-se em aberto (não solenemente definidas como dogmas de fé).

Até porque, não fosse assim, então estaríamos diante da mais cabal prova de ser o cristianismo uma religião impossível de ser seguida. Afinal, a história protestante prova, solen e irretorquivelmente, que é impossível um consenso doutrinário apoiado apenas no sola scriptura.

Forjar a necessária concordância unânime era preciso!

Com esse propósito, o papa Leão X, em 28 de Abril de 1515, como produto da 10ª Sessão do 5º Concílio de Latrão, emitiu a Bula “Inter Multiplices”, estabelecendo os Índices Expurgatórios, cujo objetivo consistia em examinar as obras patrísticas existentes. Muitas obras dos seis primeiros séculos dos pais da igreja foram repudiadas.

O argumento acima é, basicamente, o mesmo de que os agnósticos e materialistas de plantão se utilizam para negar a validade de todo o Novo Testamento. A Igreja definiu uma doutrina e, para confirmá-la, era necessário canonizar apenas os escritos cristãos que com a mesma concordavam, repudiando todos os demais.

Afinal de contas, os pais da Igreja nunca lograram unanimidade relativamente ao Cânon do Novo Testamento…

Em 8 de Abril de 1546, na 4ª Sessão do Concílio de Trento, foi levado a cabo o trabalho de “expurgo”, anteriormente estabelecido pelo papa Leão X no Concilio de Latrão. Trechos inteiros contra as pretensões (doutrinárias) romanistas refutadas pelos reformadores, foram extraídos e houve muito enxerto…muitas frases e palavras foram interpoladas no intuito de se transformar o significado dos textos ao sabor das interpretações desejadas. Como disse certo professor de seminário (católico) a um de nossos apologistas: “a interpretação dessas obras depende muito de quem as traduzem!”.

Pode-se repetir aqui, mutatis mutandis, tudo aquilo que foi dito acima. Os agnósticos e materialistas de plantão também afirmam que a Igreja, além de escolher apenas os escritos que lhe interessavam para comporem o Novo Testamento, também modificou o texto dos livros escolhidos para adequá-los ainda mais às suas doutrinas.

A balela, além de facilmente refutável, é das mais interessante.

É facilmente refutável pelo fato de que, como já se disse acima, os ortodoxos também seguem a Sagrada Tradição, e, por óbvio, não participaram desta imensa “conspiração romanista”. O simples fato de existirem as Igrejas Ortodoxas prova que a Tradição, pelo menos neste milênio, permaneceu absolutamente imutável.

A balela é das mais interessantes porque afirma, implicitamente, que a Tradição, tal como a temos hoje, é fartamente favorável ao catolicismo em todos os pontos em que católicos e protestantes divergem.

É tão francamente favorável, que a única explicação que os protestantes se permitem é a conspiração para modificá-la levada a cabo por Roma.

Todavia é importante salientar que nem mesmo as passagens que são amiúde invocadas pelos apologistas católicos com o fito de angariar apoio ás pretensões da origem e desenvolvimento do papado, não são tão relevantes assim, e muitas são até mesmo distorcidas e deslocadas do seu contexto. Muita dessa tradição entra em contradição não só com a Bíblia mas mesmo entre si como veremos.

Abaixo, veremos como o parágrafo acima é equivocado.



A IGREJA PRIMITIVA

Ao contrário do que afirma a Igreja Católica, o cristianismo primitivo não estava dividido hierarquicamente. Ademais, é um fato incontestável que não houve episcopado monárquico no primeiro século. As igrejas eram governadas por colegiados de bispos ou presbíteros que eram termos usados de modo intercambiável (ver Atos 20.17 e 28; Tito 1.5 e 7).

A afirmação acimaé absolutamente inverídica. Basta uma simples leitura das cartas paulinas para que se saiba que São Paulo governava suas igrejas com mão-de-ferro e não admitia, simplesmente, que ninguém se opusesse à sua autoridade. Os apóstolos governavam as Igrejas de uma forma muito parecida com a queb os bispos hoje governam a suas respectivas dioceses.

 

O teólogo católico José Comblin, em seu livrete intitulado “Hierarquia”, na página 18 é concorde em dizer que: “No meio deles, Pedro tem um papel de porta-voz.”, entretanto, alerta: “Mas ele não é como o superior. São todos iguais.(ênfase acrescentada). Afirma ainda que nas primeiras comunidades cristãs não havia hierarquia, pois todos estavam unidos no colegiado apostólico e “cada igreja agia de modo independente” (pág. 19).

Neste ponto, os autores do CACP utilizam-se de um expediente tão comum quanto espúrio no meio protestante: pinçam a opinião de um “católico” que seja uníssona com a que eles mesmos defendem para dar a impressão de que mesmo na Igreja Católica há aqueles que não se deixaram enganar e que lutam pela “verdade”.

Quem, afinal de contas, é este Sr. José Comblin? O fato de ele se dizer “teólogo católico” faz dele um verdadeiro teólogo e um verdadeiro católico?

Absolutamente não! A simples afirmação de que São Pedro era um mero “porta voz” entre os apóstolos é francamente herética e basta para colocá-lo em descomunhão formal com a Igreja Católica. Afinal, todo e qualquer católico digno deste nome (teólogo ou não) sabe muito bem que o documento Pastor Aeternus do Concílio do Vaticano Primeiro afirma (grifos acrescentados):

Assim, ensinamos e declaramos que, de acordo com o testemunho do Evangelho, um primado de jurisdição sobre toda a Igreja de Deus foi imediata e diretamente prometido ao bem-aventurado apóstolo Pedro e conferido a ele por Cristo, o Senhor. (…)

Portanto, se alguém disser que o bem-aventurado Pedro não foi constituído por Cristo, o Senhor, como príncipe de todos os apóstolos e cabeça visível de toda a Igreja militante; ou que era apenas um primado de honra e não de verdadeira e própria jurisdição que foi recebida direta e imediatamente do próprio Nosso Senhor Jesus Cristo: seja anátema”.

Portanto, uma vez que o Sr. José Comblin (que, se é verdadeiramente um teólogo, não pode desconhecer o estatuído acima) incide, diretamente, no anátema do CVI supra-citado, ele pode ser tudo, menos católico.

Por outro lado, mundo afora, são muitos os protestantes que, numa lufada de bom senso, reconhecem a primazia petrina. Citaremos apenas alguns. Todos os trechos abaixo foram retirados do site http://ic.net/~erasmus/RAZINDEX.HTM, e traduzidos por mim:

So Peter, in T.W. Manson’s words, is to be ‘God’s vicegerent . . . The authority of Peter is an authority to declare what is right and wrong for the Christian community. His decisions will be confirmed by God’ (The Sayings of Jesus, 1954, p.205).” (“A autoridade de Pedro é uma autoridade de declarar o que é certo e o que é errado para a comunidade cristã. Suas decisões serão confirmadas por Deus”). (New Bible Dictionary, ed. J.D. Douglas, Grand Rapids, MI: Eerdmans Pub. Co., 1962, 1018)

“Not only is Peter to have a leading role, but this role involves a daunting degree of authority (though not an authority which he alone carries, as may be seen from the repetition of the latter part of the verse in 18:18 with reference to the disciple group as a whole). The image of ‘keys’ (plural) perhaps suggests not so much the porter, who controls admission to the house, as the steward, who regulates its administration (cf. Is 22:22, in conjunction with 22:15). The issue then is not that of admission to the church . . . , but an authority derived from a ‘delegation’ of God’s sovereignty.” [“Pedro não apenas exerce um papel de comando, mas este comando envolve um amedrontador grau de autoridade (embora não seja uma autoridade que ele carregue sozinho, como pode ser percebido pela repetição da última parte do versículo em 18, 18, referindo-se ao grupo de discípulos como um todo). A imagem das ‘chaves” (no plural) talvez sugira não tanto um porteiro, mas um mordomo, que regula a administração (cf. Is 22, 22 em conjunção com 22,15). A questão, então, não se refere à admissão da Igreja, …, mas a uma autoridade derivada de uma delegação de Deus.]. (R.T. France; in Morris, Leon, Gen. ed., Tyndale New Testament Commentaries, Leicester, England: Inter-Varsity Press / Grand Rapids, MI: Eerdmans Pub. Co., 1985, vol. 1: Matthew, 256)

Just as in Isaiah 22:22 the Lord puts the keys of the house of David on the shoulders of his servant Eliakim, so does Jesus hand over to Peter the keys of the house of the kingdom of heaven and by the same stroke establishes him as his superintendent. There is a connection between the house of the Church, the construction of which has just been mentioned and of which Peter is the foundation, and the celestial house of which he receives the keys. The connection between these two images is the notion of God’s people.” [“Assim como em Is 22, 22 o Senhor põe as chaves da casa de Davi nas mãos de Seu servo Eliaquim, assim Jesus entrega a Pedro as chaves da casa do Reino dos Céus estagelecendo-o, com este mesmo gesto, como seu superintendente. Há uma conexão entre a casa da Igreja, cuja construção havia sido mencionada e da qual Pedro é o fundamento, e a casa celestial da qual ele recebeu as chaves. A conexão entre ambas as imagens é a noção do Povo de Deus.”]. (Oscar Cullmann, Peter: Disciple, Apostle, Martyr, Neuchatel: Delachaux & Niestle, 1952 French ed., 183-184)

 

“Thus, Peter is given the authority to determine the rules for doctrine and life . . . and to demand obedience from the Church, reflecting the authority of the royal chamberlain or vizier in the Old Testament (cf. Isa. 22:22 . . . )”. [“Assim, a Pedro é dada a autoridade de determinar as regras para a doutrina e para a vida … e para exigir obediência da Igreja, refletindo a autoridade do mordomo real ou vizir no Velho Testamento (cf Is 22, 22).]. (The Eerdmans Bible Dictionary (edited by Allen C. Myers, Grand Rapids, MI: Eerdmans Pub. Co., 1987 — from Bijbelse Encyclopedie, ed. W.H. Gispen, Kampen, Netherlands, 1975 –, 1014-1015).

 

Portanto, a tal supremacia de Pedro sobre os demais são argumentos inconsistentes, pueris que veio à tona apenas 200 anos depois da morte de Cristo, e que posteriormente foi usado para promover a doutrina do papado. Há de se ressaltar que em meados do século II, borbulhavam, muitas obras apócrifas contendo histórias sobre este apóstolo, tais como: Os Atos de Pedro, Evangelho de Pedro, Apocalipse de Pedro e outras. Isto posto, declaramos que não há indício algum de que Cristo tenha feito de Pedro o chefe, ou como costuma dizer o hierarca romano: o príncipe dos apóstolos. Tudo isto é argumento gratuito.

Como se vê, os protestantes citados acima não concordam com os do CACP. Aliás, também não concordam com os mesmos os maiores teólogos da história do cristianismo, todos unânimes em afirmar que São Pedro foi o príncipe dos apóstolos.

Diante disto, a “declaração” feita pelo CACP não possui qualquer autoridade.

ENTÃO COMO SE DEU A ORIGEM DO PAPADO ?

Seja como for, uma coisa é certa: ela não se deu da noite para o dia. O desenvolvimento da sé romana e a supremacia de seu líder se deram paulatinamente.

É verdade que o papado, tal como o conhecemos hoje, foi-se desenvolvendo no transcorrer dos séculos. No entanto, ele já existia desde o princípio da Igreja, e permanecerá até o fim dos tempos.

Nos primeiros anos (a Bíblia e a Tradição são unânimes em afirmá-lo) São Pedro era a cabeça visível da Igreja, Princípe dos Apóstolos e Chefe do Colégio Apostólico. Ele fundou a Igreja de Roma por volta do ano 43 d. C. e, desde então, esta Igreja passou a ter a primazia entre todas as demais.

Com a morte de Simão Pedro, sucedeu-lhe Lino à cabeça da Igreja de Roma e os cristãos, desde então, perceberam que o corolário lógico e inexorável do primado petrino era o fato de que o mesmo continaria na figura de São Lino e na daqueles que viessem a sucedê-lo, até o Papa atual.

 

A primeira menção desta igreja aparece na epístola do apóstolo Paulo dirigida aos cristãos ali congregados. Algo que merece nossa atenção é que nesta epístola, Paulo manda saudações a diversos irmãos, mas em nenhum momento menciona o suposto papa “São Pedro” ou sua primazia.

São Paulo não precisava fazer menções ao primado de São Pedro aos romanos porque todos estavam muito a par deste fato. Lembremos, sempre, que até então não havia protestantes no mundo (e, a bem da verdade, não haveria até meados do século XVI).

E não saúda São Pedro porque, com muita probabilidade, o mesmo não se encontrava em Roma naquele momento. Os apóstolos viajavam muito, e mesmo São Paulo, fundador e bispo de várias Igrejas, com freqüência se separava de um seus rebanho para pastorear um outro mais necessitado.

Roma não foi a única Igreja capitaneada por São Pedro. A Igreja de Jerusalém também o foi; igualmente, a de Antioquia; por fim, a de Alexandria, fundada por São Marcos a mando de São Pedro. É possível que outras tenham sido, igualmente, fundadas e/ou dirigidas pelo Princípe dos Apóstolos.

Assim, é abslutamente normal que São Pedro se afastasse, por longos períodos, da Igreja de Roma, assim como o próprio São Paulo se afastava, por exemplo, da Igreja de Filipos.

A necessidade pastoral de então era muito diversa da realidade de hoje.

No entanto, e aproveitando o ensejo que o CACP involuntariamente concedeu, é fato interessantíssimo (e de um significado tão avassalador que deveria bastar por si só) que as quatro Igrejas petrinas foram as que, desde o princípio do cristianismo, mantiveram um primado sobre todas as demais. Uma simples leitura da História Eclesoástica de Eozébio de Cesaréia, nos revela que Roma, em primeiro lugar, e depois Jerusalém, Antioquia e Alexandria eram as Igrejas mais dignas de honra e de veneração entre os cristãos primitivos, tidas por todos como guardiãs da fé e inexpugnáveis pelas heresias que pululavam em vários locais. As Igrejas fundadas por São Paulo jamais gozaram desta fama, o que revela o imenso abismo com que os cristãos primitivos tratavam São Pedro e São Paulo.

Contudo, muitos fatores contribuíram para dar vida ao papado no cenário mundial; eis alguns deles:

AS TRADIÇÕES: No segundo século surgiu uma tradição propalada por Irineu de que tanto Paulo como Pedro, haviam fundado e dirigido àquela igreja, posteriormente diz outra “tradição” levada a cabo por Orígenes de que os dois haviam sido martirizados naquela cidade.

A afirmação acima é quase que um “tiro no pé” que os autores deste texto se deram. Ora, se a “tradição” segundo a qual São Pedro e São Paulo foram os bispos da Igreja de Roma data do início do segundo século, então esta “tradição” conta com o testemunho ocular de inúmeras pessoas que ainda estavam vivas quando ela surgiu (como o próprio Santo Irineu, conforme reconhece o CACP).

Portanto, estamos diante de uma prova histórica da veracidade de tudo aquilo que afirma a Igreja, e do equívoco dos protestantes em tentar negar esta fato.

 

 

Jerônimo chega a dizer que Pedro governou esta igreja durante 25 anos. Assim, mais e mais foi se solidificando a lenda de que Pedro havia fundado a igreja em Roma e transferido para lá o seu pontificado, sem ter contudo apoio bíblico. Este foi apenas o embrião da supremacia da igreja de Roma. Outrossim, visto à grosso modo, muitos pais da igreja como Cipriano e Irineu deram a entender que a sé romana tinha algum tipo de supremacia sobre as demais, ainda que limitada.

Novamente, estamos diante de uma confissão de equívoco, o que aproxima este texto de uma verdadeira pantomina. Os autores reconhecem (até porque não lhes restaria outra alternativa) que os pais da Igreja, muito cedo, já atribuíam à Igreja de Roma a primazia entre as demais.

AUMENTO DO PODER: Além disso, já numa época remota, a igreja de Roma tornou-se a maior, a mais rica e a mais respeitada de toda a cristandade ocidental. Outro fator que contribuiu para a ascendência da igreja romana e do seu líder foi a própria centralidade e importância da capital do Império Romano.

Chega a ser impressionante a visão enviesada que os membros do CACP têm da história. É certo que, nos primeiros séculos da nossa era, a cidade de Roma era a maior e mais rica e, portanto, a que exercia maior influência entre os povos.

No entanto, não foi por este motivo que a Igreja de Roma tornou-se a principal entre todas as demais.

Aliás, os motivos não poderiam ser mais diversos.

Em primeiro lugar, ela tornou-se a principal Igreja porque foi fundada pelos dois principais apóstolos do Cristianismo: São Pedro e São Paulo. Além deste motivo, ela tornou-se a principal Igreja porque, nela, manteve-se a sucessão de São Pedro, Chefe dos Apóstolos. Portanto, deste São Lino que esta Igreja é presidida pelo Chefe de todas as Igrejas.

E, por fim, esta Igreja tornou-se a mais venerada e admirada entre todas porque nela é que se derramou o sangue da mais numerosa e gloriosa multidão de mártires que o cristianismo já conheceu.

Roma foi provada pelo fogo em uma dimensão tal que nenhuma outra Igreja jamais o havia sido, nem voltou a ser.

Novamente, basta uma simples leitura da História Eclesiástica para se certificar deste fato.

 

Logo apareceram cinco cidades que se destacaram como metrópoles: Roma, Constantinopla, Alexandria, Antioquia e Jerusalém, os bispos destas regiões receberam o título de “Patriarcas”. Apesar dos bispos das igrejas serem iguais uns aos outros na administração dos ritos litúrgicos e na doutrina, eles começaram a distinguir-se em dignidade de acordo com a importância dos lugares onde estavam localizadas suas dioceses. Ao Bispo de Roma foi concedida a precedência honorária simplesmente porque Roma era então a capital política do mundo, ele foi considerado “o primeiro entre os iguais”.

No texto acima, fica evidente a falha na tese adotada no texto. É verdade que Roma e Alexandria eram grandes centros, mas Jerusalém e Antioquia não eram. Ao mesmo tempo, cidades como Tarso, Atenas e Corinto eram de suma importância cultural e geo-política.

Se o argumento dos autores deste texto fizesse algum sentido, as Igrejas de Jerusalém e de Antioquia (que eles mesmo reconhecem como importantes) não teriam importância alguma, ao passo que as de Atenas, Corinto e Tarso seriam mencionadas entre as maiores (e jamais o foram).



PREDOMINÂNCIA DO BISPO ROMANO (I) : Outro elemento importante é que desde cedo a igreja romana e os seus líderes reivindicaram direta ou indiretamente, certas prerrogativas especiais.. No fim do segundo século, o bispo Vítor (189-198) exerceu considerável influência na fixação de uma data comum para a Páscoa, algo muito importante face à centralidade da liturgia na vida da igreja. Relevante também foi o alvitre de S. Irineu (202) o qual, como ele mesmo confessa, procurou conscienciosamente um bispo que pudesse ser aceito pela maioria do episcopado, para desempenhar a missão de árbitro nas questões disciplinares e nas dúvidas e controvérsias doutrinárias, que surgiam freqüentemente entre os bispos das várias igrejas.

A maneira pela qual os membros do CACP abordaram a questão de São Vítor e de Santo Irineu é, para falar muito pouco, muitíssimo tímida. Quem lê estas linhas e desconhece a história pode, realmente, pensar que São Vítor teve, apenas, “considerável influência na fixação da data da Páscoa.”

Nada mais longe da verdade.

Comecemos pelo princípio. Algumas igrejas da Ásia celebravam a Páscoa segundo o calendário judaico (no dia 14 de Nisã), pelo que a celebração de tais igrejas não caia num dia fixo da semana. Tais Igrejas asiáticas argumentavam que tal costume derivava diretamente de São João Apóstolo, sendo esta a sua linha de defesa.

No Ocidente, contudo, desde cedo, a cristandade celebrava a Páscoa no primeiro domingo após o equinócio da primavera, de modo que a data da Páscoa, embora variando de ano a ano, fosse sempre celebrada no Domingo, o Dia do Senhor.

São Vítor era, então, o bispo de Roma e, querendo unificar a celebração da Páscoa, excomungou todas as Igrejas Asiáticas que não viesse a adotar o costume ocidental. Santo Irineu, então, resolveu intervir. Viajou para Roma e entrevistou-se com São Vítor, rogando para que ele não excomungasse Igrejas inteiras por uma questão meramente disciplinar. São Vítor, então, percebendo que a excomunhão causaria mais danos do que benefícios, aquiesceu ao pedido de Irineu e retirou a excomunhão.

O episódio é absolutamente devastador contra a tese defendida pelo CACP. Se São Vítor era apenas “o primeiro entre iguais”, então, ele jamais teria direito de excomungar igrejas inteiras por uma questão meramente disciplinar. O fato de Santo Irineu ter ido até Roma intervir junto ao Papa indica que este último tinha realmente jurisdição universal, com poder de desligar da comunhão da Igreja todos quantos se recusassem a obedecer as suas ordens.


Esta proposta foi aceita quase imediatamente pela quase totalidade das igrejas, e fez que o Bispo de Roma começasse a ser consultado com freqüência, o que muito contribuiu para aumentar a sua autoridade, embora a primeira decretal oficial (carta normativa de um bispo de Roma em resposta formal à consulta de outro bispo) só tenha surgido em 385, com Sirício. Por volta de 255, o bispo Estêvão utilizou a passagem de Mateus 16.18 para defender as suas idéias numa disputa com Cipriano de Cartago. E Dâmaso I (366-84) tentou oferecer uma definição formal da superioridade do bispo romano sobre todos os demais.

Os membros do CACP cometeram (muito provavelmente, de forma não intencional…) um equívoco gigantesco. Todos os episódios acima são tomados como geradores do poder papal (isto é, segundo os autores, o poder papal surge de tais episódios). Na verdade, eles são meros reflexos de um poder que já existia.

Não se concebe que, como reconhecem os próprios autores, a quase totalidade das igrejas tenha aceitado que Roma viesse a ser a fiel da balança em questões doutrinárias e disciplinares (obrigando, com sua opinião, a todos) se, antes disto, estas mesmas igrejas já não vissem na Igreja Romana, uma dignidade superior a todas as demais.

Essas raízes da supremacia eclesiástica romana foram alimentadas pelas atividades capazes de muitos papas. No quinto século destaca-se sobremaneira a figura de Leão I (440-61), considerado por muitos na verdade”o primeiro papa”. Leão exerceu um papel estratégico na defesa de Roma contra as invasões bárbaras e escreveu um importante documento teológico sobre a pessoa de Cristo (o Tomo) que exerceu influência decisiva nas resoluções do Concílio de Calcedônia (451). Além disso, ele defendeu explicitamente a autoridade papal e usou muito o titulo “papa” (mais tarde Gregório VII, reivindicou para a sé romana este título com exclusividade) articulando mais plenamente o texto de Mateus 16.18 como fundamento da autoridade dos bispos de Roma como sucessores de Pedro. Seu sucessor Gelásio I (492-96) expôs a teoria das duas espadas: dos dois poderes legítimos que Deus criou para governar no mundo, o poder espiritual – representado pelo papa – tinha supremacia sobre o poder secular sempre que os dois entravam em conflito.O Sínodo de Sárdica declarava que se um bispo fosse deposto pelo sínodo de sua província, este poderia apelar para o bispo de Roma. Já o Sínodo de Palma declarava que o bispo de Roma não estava submisso a nenhum tribunal humano.

O parágrafo acima está correto.

 

O máximo de pretensão papal de supremacia se encontra no artigo 22 do Dictatus do papa Gregório VII em que se afirma que jamais houve erro na Igreja Romana.

São Gregório VII apenas repetia aquilo que Santo Agostinho, há mais de quinhentos anos, já havia afirmado: Roma Locuta, Causa Finita Est. Ora, esta afirmação de Santo Agostinho (que jamais foi combatida por ninguém até a eclosão da revolta protestante) apenas se justifica se, previamente, for aceita a infalibilidade do papado. Esta infalibilidade é o pressuposto lógico da fé augostiniana.

 

 

Já Inocêncio III cria ser o papa, o verdadeiro “Vigário de Cristo” na terra. O imperador Valentiniano III num edito de 445, reconhece a supremacia do bispo de Roma: “Para que uma tola perturbação não venha a atingir as igrejas ou ameace a paz religiosa, decretamos – de forma permanente – que não apenas os bispos da Gália mas também os das outras províncias, não venham a atentar contra o antigo costume [de submeter-se à] autoridade do venerável padre (papa) da Cidade Eterna. Assim, tudo o que for sancionado pela autoridade da Sé Apostólica será considerado lei por todos, sem exceção. Logo, se qualquer um dos bispos for intimado a comparecer perante o bispo romano, para julgamento, e, por negligência, não comparecer, o moderador da sua província deverá obrigá-lo a se apresentar.”

Novamente, o decreto acima apenas demonstra que, em 445 d. C., já não havia qualquer dúvidas acerca da jurisdição do Papa.

PREDOMINANCIA DO BISPO ROMANO (2) : Comitantemente às reivindicações eclesiásticas cresceu também o poder temporal dos papas devido ao declínio dos principais rivais de Roma. O bispo de Jerusalém perdeu o poder após a destruição pelos romanos. O bispo de Éfeso perdeu o poder quando foi sacudida pelo cisma montanista. Alexandria e Antioquia declinaram logo também, deixando Roma e Constantinopla como as maiores sedes do cristianismo primitivo. Todavia as guerras teológicas e os inúmeros cismas juntamente com as invasões dos mulçumanos, aos poucos foram minando a unidade dos orientais, deixando isolado o bispo de Roma. Este foi se solidificando cada vez mais no Ocidente como o “pai” dos cristãos. Coube a ele defender Roma dos ataques bárbaros. Muito ajudou, a conversão destes povos para o cristianismo romano; no que mais tarde iria desembocar no famigerado poder temporal.

É impressionante o despautério dos autores deste texto. São impressionantes as incongruências em que, sempre e sempre, os mesmos incorrem. É impressinonante a falta de lógica e os desvios de história de que são capazes de se socorrer para sustentar um ponto de vista a priori insustentável.

A tese defendida pelos protestantes é das mais escabrosas e contraditórias de que eu já tive notícia.

Quando surgiu o cristianismo, Roma estava em seu apogeu. A partir daí, a mesma entrou em lento declínio, e, já no século IV estava em franca decadência. Tal decadência acentuou-se com as invasões bárbaras e, na Alta Idade Média, a outrora gloriosa Roma era uma mera sombra do seu passado.

Por sua vez, Constantinopla rapidamente tornou-se o centro do Império Romano e subsistiu, forte e influente até o fim da Idade Média, quando foi tomada pelos turcos.

Ora, se houvesse qualquer razão no quen dizem os membros do CACP, então a influência da Igreja de Roma deveria ter sido mais aguda no princípio do cristianismo, declinando lentamente até desaparecer por completo no início da Idade Média, sendo substituída pela influência de Constantinopla.

Ou seja: rigorosamente o oposto daquilo que eles defendem!

Seria risível, se não fosse lamentável…

FALSOS DOCUMENTOS : Essas teorias fictícias, que foram destinadas a ser reconhecidas como verdadeiras por alguns séculos – entretanto mais tarde identificadas claramente como as fraudes mais habilmente forjadas – são duas: as Pseudo-Clementinas e os Decretos do Pseudo-Isidoro.

Este trecho é bastante curioso, pois foi recortado e colado de um texto de um autor ortodoxo, sem qualquer citação da fonte verdadeira. Nada contra recorrer-se a fontes (muito embora protestantes deveriam ter ogerizas relativamente a autores ortodoxos), mas não as citar e usar um texto alheio como se fosse original é impostora intelectual.



Os Escritos Pseudo-Clementinos – A Tentativa de Promover Pedro e a Sé de Roma ao Poder Supremo. Os escritos Pseudo-Clementinos eram “Homílias” (discursos) espúrios erroneamente atribuídos ao Bispo Clemente de Roma (93-101), que tentavam relatar a vida do Apóstolo Pedro. O objetivo era um só: a elevação de Pedro acima dos outros Apóstolos, particularmente o Apóstolo Paulo, e a elevação da Sé de Roma diante de qualquer outra Sé episcopal. “Pedro”, era alegado, “que foi o mais hábil de todos (os outros), foi escolhido para iluminar o Ocidente, o lugar mais escuro do Universo”.

É isto o que dá colar textos alheios sem estudar especificadamente o objeto. Os escritos pseudo-Clementinos nem de longe têm, como único objetivo, exaltar a figura de São Pedro e a Sé Romana. Ao contrário, neles chega-se mesmo a afirmar que São Tiago Menor, bispo de Jerusalém, seria superior a São Pedro (seria uma maneira bastante curiosa de exaltar Pedro acima dos demais apóstolos…). Este fato levou muitos a suporem que tais escritos derivassem de judeus-cristãos ebionitas que, por óbvio, tinham especial apreço pela figura de São Tiago.

Na verdade, tais escritos são francamente heréticos, e o cerne dos mesmos é o arianismo. São escritos que esposam a teroria de que Cristo é mera criatura e de que o Espírito Santo é, por sua vez, mera criatura de Cristo.

Tais doutrinas sempre foram severamente combatidas pela Igreja, tanto que, até hoje, apenas dentro do protestantismo é que bobagens como estas ainda encontram espaço para enganar os incautos.

As “Homilias” foram escritas para amoldar a interpretação equivocada de Mateus 16:18-19, que “tu és Pedro, e sobre esta rocha edificarei minha igreja . . . e dar-te-ei as chaves do reino do céu”. É equivocada porque a palavra “rocha” não se refere a Pedro, mas à fé em que “Tu és o Cristo, o Filho do Deus Vivo” (v. 16). Não há mencionado na Bíblia um só sinal da primazia de Pedro sobre os outros Apóstolos e, se uma primazia era pretendida, uma decisão de tal importância e magnitude certamente teria sido mencionada na Bíblia em linguagem inequívoca.

Para esclarecer o parágrafo acima (e para demonstrar o quanto o mesmo é equivocado), leiam-se as cinqüenta provas bíblicas do primado petrino acima mencionadas.

Em muitos casos o contrário é verdadeiro; Paulo escreveu aos Gálatas, “eu me opus a ele (Pedro) em rosto, porque ele estava sendo censurável” (2,11); além disso, é bem sabido que Pedro negou Cristo por três vezes.

O episódio de Gálatas acima descrito não somente não ofusca a primazia de São Pedro como, bem entendido e contextualizado, é uma das mais irrefutáveis evidências desta primazia. Sobre isto, eu mesmo já escrevi um artigo que pode ser acessado no seguinte link: https://www.veritatis.com.br/article/6.

Por sua vez, usar as negações de São Pedro como argumento contra o papado é, convenhamos, de pueridade sem limites. É verdade que o Princípe dos Apóstolos negou o Mestre três vezes, mas, depois disto, e por provocação do próprio Cristo, confessou seu amor por Ele também três vezes. E, nesta ocasião, ouviu de Sua boca, por três vezes, a missão que lhe era conferida: apascenta minhas ovelhas.

Um verdadeiro fiasco…

Pedro não fundou a Igreja de Roma; ele efetivamente permaneceu em Antioquia por vários anos antes de chegar a Roma. Dizer que, assim como Cristo reina no Céu, Pedro e seus sucessores os papas governam a Terra, é uma afirmação contrária ao espírito do Evangelho e ao entendimento da Igreja antiga. Cristo era e é a pedra angular e a Cabeça da Igreja, que consiste de todos os membros de Seu Corpo (cf. Col.1:24).

As Pseudo-decretais ou decretais pseudo-isidorianas (754 – 852). Eram falsificações entre as quais se encontrava a tal “doação de Constantino”. Neste documento constava uma suposta dádiva que o imperador fizera ao bispo de Roma, doando-lhe todas as terras do império em recompensa de uma cura recebida. Colocava o bispo de Roma como”caput totius orbis” (cabeça de toda a terra), tanto sobre a igreja (poder espiritual) como sobre os territórios (poder temporal). Esta falsificação foi considerada autentica até o século XV, e ajudou muito o bispo romano reforçar o primado papal, dando um aparente fundamento jurídico às pretensões dos papas. Os papas usaram e abusaram destes falsos documentos!

Sobre os pseudo-decretos de Isidoro, o leitor pode ter esclarecimentos acessando o seguinte link: https://www.veritatis.com.br/article/21

ELEVAÇÃO DO BISPO


Se existe algo que a história da Igreja ensina, este algo é que às vezes um forte zelo pela doutrina ou ênfase demasiada em certos aspectos da vida desta que fora esquecido e tornou a ser resgatado, pode levar uma pessoa ou igreja voluntariamente ao erro. Um exemplo registrado nos anais da história é de Sabélio, que chegou a negar a Trindade ao tentar salvaguardar a unidade de Deus, Ário descambou para uma interpretação anti-biblica do relacionamento de Cristo com o Pai em sua tentativa de evitar aquilo que ele considerava ser o perigo do politeísmo.

O pensamento dos membros do CACP é bastante curioso. Para eles, o zelo pela doutrina é um perigo que deve ser evitado. Afinal, foi este zelo que teria levado Sabélio, Ário e tantos outros a pregarem heresias.

O estranho é que Lutero também iniciou sua revolta sob o manto de um pretenso zelo doutrinário…

A semelhança entre Sabélio, Ário, Lutero et caterva não é o zelo pela doutrina. Não é este (e nunca o foi) o traço comum entre todos os hereges de todos os tempos. O que os une é uma idolatria de suas próprias opiniões, que os levam, invariavelmente, a supor que os mesmos podem estar certos e que a Igreja fundada por Cristo, e detentora, por vontade divina, das chaves do céu possa estar errada.

Todos os hereges colocaram suas próprias conclusões àcima do Magistério da Igreja. Se zelo tiveram, foi por seus próprios egos, e não pela correição doutrinária.


A doutrina romana da “Sucessão Apostólica” e da elevação do poder do bispo sai igualmente deste molde. Tentando defender a fé ortodoxa das heresias vigentes da época, alguns pais da igreja criaram um mecanismo de defesa contra os hereges (gnósticos) centralizado no poder dos bispos e a elevação deste sobre os presbíteros. Isto mais tarde foi deturpado e alargado pelo bispo de Roma. Por volta do ano 110, Inácio bispo de Antioquia na Síria escreve sobre a importância do bispo na igreja, diz ele: ” Cuidado para que todos obedeçam ao bispo, como Jesus Cristo ao Pai, e o presbiterato como aos apóstolos, e prestem reverência aos diáconos como sendo instituição de Deus. Que os homens não façam nada relacionado à Igreja sem o bispo. Que seja considerada uma apropriada Eucaristia àquela que é (celebrada) seja pelo bispo, seja por alguém a quem ele a confiou. Onde o bispo estiver, ali esteja também a comunidade (dos fiéis); assim como onde Jesus Cristo está, ali está a Igreja Católica. Não é legal sem o bispo batizar ou celebrar festa de casamento; mas tudo o que ele aprovar, isso será aprovado por Deus, de modo que qualquer coisa que seja feita, seja segura e válida” (Inácio de Antioquia, Epístola à igreja em Esmirna 8).

 

Veja só como funciona o apriorismo protestante. Eles concebem uma igreja sem hierarquia e (por óbvio) afirmam que esta estrutura, digamos, eclesial é a instituída por Jesus Cristo. Então, confrontados com um texto do ano 110 d. C. e que demonstra de forma cabal e inexorável que a Igreja de então já possuia os moldes preservados pela Igreja Católica, ao invés de convencerem dos seus erros, afirmam que este texto já é uma deturpação.

Estamos um mecanismo de proteção intelectual digno de estudo…

Qualquer pessoa minimamente isenta, ao abordar o texto de Santo Inácio chegaria a conclusões bastante diversas. No ano 110 d. C., muito provavelmente São João ainda estava vivo e, com toda a certeza, ainda viviam muitos dos que haviam recebido o Evangelho diretamente da boca dos apóstolos. Não houve tempo nem espaço para que se tivessem introduzido, na estrutura eclesiástica original, quaisquer desvios. A tentativa “espúria” de criar um cristianismo hierarquizado seria rechaçada e denunciada por aqueles que, tendo vivido com os apóstolos, sabiam ser isto um erro.

Portanto, e tendo em vista o que acima se disse, o texto de Santo Inácio é uma prova histórica, objetiva e inequívoca de que a Igreja Cristã sempre contou com uma hierarquia e que, portanto, tal hierarquia provém do próprio Cristo.

Tal conclusão, contudo, é inaceitável para os protestantes, visto que o protestantismo originou-se como um movimento que, desde os princípios, rejeitou a submissão à hierarquia da Igreja.

Nesta mesma época Clemente de Roma escreve sua carta aos Coríntios para corrigir os cismas que estava havendo entre eles, pois estes haviam chegado a ponto de expulsarem os presbíteros da igreja. Clemente escreve-lhes para impor a importância da hierarquia dos bispos.

 

Como veremos mais abaixo, novamente os protestantes do CACP foram muito tímidos ao abordarem estes escritos de São CLemente. Eles mostram e provam que este Papa tinha poder de interferir na Igreja de Corinto, demonstrando, cabalmente, que desde o princípio a jurisdição do bispo de Roma não tinha froanteiras.

 

 

Mais tarde, Irineu, em sua obra apologética, “Contra Heresias”, uma refutação aos argumentos gnósticos, que haviam apelado para a tradição, desenvolve uma linhagem histórica de sucessão episcopal desde os apóstolos até os bispos atuais, tomando como exemplo a Igreja de Roma, por ser a mais conhecida entre todas.


Já no ano 200 existe um bispo em cada cidade se declarando cada qual sucessores dos apóstolos. Cada um procura mostrar que o primeiro da lista foi um apóstolo, assim temos as listas das principais igrejas da época:

Jerusalém: 1. Tiago, irmão de Jesus 2. Simeão 3. Justo 4.Zaqueu 5. Tobias…

Antioquia: 1. Pedro Evódio 2. Inácio 3. Heros 4. Cornélio 5. Eros…

Alexandria: 1. Marcos (evangelista) 2. Aniano 3. Abílio 4. Cerdo 5. Primo…

Roma: 1. Pedro e Paulo (?) 2. Lino 3. Anacleto ou Cleto 4. Clemente 5. Evaristo…

Nesta época a hierarquia já era constituída por 1º- Bispo, 2º- Presbítero, 3º Diáconos. Mais tarde o Concílio de Nicéia estabelece um bispo para cada cidade. No entanto, apesar desta gradual elevação do cargo do bispo, ainda não se fala em supremacia do Bispo de Roma sobre os demais, nem de papa, pois todos eram iguais e independentes, havendo uma união fraternal entre as várias igrejas. Se às vezes a sé romana parece elogiada em demasia é devido à sua posição política e territorial; é devido unicamente ao seu status de capital do Império.

Tudo isto já foi esclarecido acima. Novamente, os protestantes reconhecem que a hierarquia católica já estava consolidada por volta do ano 200 d. C., o que manda às favas a teoria da fundação constantiniana do catolicismo por eles mesmo defendida.

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