NA HUMANIDADE há a forte tendência de invejar os que têm destaque, grande êxito ou mais bens materiais. Esta inclinação é tão forte, que a Bíblia diz: O Espírito que habita em nós cobiça com inveja Tia. 4,5 (siríaco peshitta).
Diz o Catecismo:
2539 – A inveja é um vício capital. Designa a tristeza sentida diante do bem do outro e do desejo imoderado de sua apropriação, mesmo indevida. Quando deseja um grave mal ao próximo, é um pecado mortal:
Sto. Agostinho via na inveja “o pecado diabólico por excelência”. “Da inveja nascem o ódio, a maledicência, a calúnia, a alegria causada pela desgraça do próximo e o desprazer causado por sua prosperidade”.
Embora o Espírito, a inclinação ou a disposição de invejar resida em todos nós, homens imperfeitos, isto não faz com que a inveja seja algo a ser tolerado à vista de Deus. As invejas são condenadas junto com a fornicação, a conduta desenfreada e as bebedeiras, como práticas aviltantes da carne, que impedem que alguém herde o reino de Deus. (Gál. 5,19-21) Mas, por que expressa Deus uma desaprovação tão forte da inveja?
O Catecismo diz:
2553 – A inveja é a tristeza sentida diante do bem de outrem e o desejo imoderado de dele se apropriar. É um vício capital.
Porque a inveja se arraiga no egoísmo e é completamente alheia à personalidade, aos modos e aos tratos do Criador. A qualidade dominante de Deus é o amor, e ele reconhece como seus servos aprovados apenas os que manifestam tal amor.
O invejoso, a quem falta amor, recusa-se a se alegrar com os que se alegram. (Rom. 12,15) Ele talvez até mesmo recorra à fraude, ao roubo ou a outras práticas desonestas no empenho de se apoderar do que os outros têm. Ou talvez procure rebaixar o abjeto de sua inveja, depreciando as realizações de tal pessoa por meio de indevida crítica ou por questionar sua capacidade e sua motivação. A inveja dá assim à luz a rixa, a dissensão, as contendas, os ódios e até mesmo conflitos violentos, destruindo o que de outro modo poderiam ter sido boas relações com o próximo. É a isto que se refere Tiago 4,1. 2, onde lemos: Donde procedem as guerras e donde vêm as lutas entre vós? Não vêm disso, a saber, dos vossos desejos ardentes de prazer sensual, que travam um combate nos vossos membros? Desejais, e ainda assim não tendes. Prosseguis assassinando e cobiçando, contudo, sois incapazes de obter.
Naturalmente, a tendência de invejar não se limita aos que procuram obter destaque e prosperidade por métodos desonestos. Por exemplo, o trabalho árduo e a eficiência são elogiáveis. Mas, alguém talvez dê muita ênfase a estes, por causa duma tendência de invejar. Como? Porque talvez trabalhe arduamente não para realizar algo meritório, mas com o desejo de ultrapassar outros no trabalho, na perícia ou na produtividade. A inveja o impele a procurar alcançar o que os outros alcançaram, e, de fato, a superá-los. Este aspecto é reconhecido pelo escritor perspicaz de Eclesiastes: Eu mesmo vi todo o trabalho árduo e toda a proficiência no trabalho, que significa rivalidade de um para com o outro; também isto é vaidade e um esforço para alcançar o vento. Ecl. 4,4.
Quando a motivação de alguém no trabalho é maculada pela autoglorificação, todo interesse e simpatia da sua parte para com os outros amiúde ficam eclipsados. As limitações físicas e mentais deles recebem pouca ou nenhuma consideração. A competição e a rivalidade substituem o espírito de cooperação amigável. Talvez se use uma norma injusta de critério, de modo que a mera quantidade se torna a norma de comparação, deixando fora a consideração da qualidade ou do empenho sincero e altruísta que houve no trabalho do outro. O valor da pessoa talvez seja julgado principalmente pelo que pode produzir, em vez de pelo que é.
Certos esforços de ultrapassar os outros são prejudiciais, e os que fazem tais empenhos se esforçam para alcançar o vento, o mero nada. Quem divulga as suas realizações e se compara com os outros cria competição e inveja. Por tentar impressionar os outros com a sua própria superioridade, recusa-se em inveja a reconhecer as boas qualidades que os outros talvez possuam. Ele protege ciumentamente sua posição, temendo que outros possam tornar-se iguais a ele, e, talvez, até mesmo ultrapassá-lo. Todas estas ações são contrárias à injunção bíblica dada aos cristãos: Não fiquemos egotistas, atiçando competição entre uns e outros, invejando-nos uns aos outros. Gál. 5,26.
Na Igreja, muitos cristãos precisam ter cuidado para que não comecem a pensar demais de si mesmos e de suas consecuções. Isto poderia levá-los a impedir que outros compartilhem de certos privilégios, só porque eles mesmos querem permanecer muito em destaque. Devem sempre lembrar-se de que Deus é Aquele que dá o aumento. A Igreja não pertence a um homem, mas a Deus. Atos 20,28; 1 Cor. 3,7.
Relutar algum homem ou um grupo de homens que outros compartilhem das responsabilidades significaria agir contrário à orientação do espírito de Deus. O apóstolo Paulo instruiu Timóteo, como superintendente, a transmitir o que havia aprendido a homens fiéis, os quais, por sua vez, estarão adequadamente habilitados para ensinar outros. (2 Tim. 2,2) Portanto, o espírito correto é os padres se empenharem para ajudar outros homens na Igreja a alcançar as qualificações necessárias para servir com eles em cuidar das responsabilidades quer subconscientemente, que sua importância diminua na Igreja, agiriam não só contra os seus próprios interesses, mas também contra os interesses da Igreja inteira. É evidente que muitos homens habilitados podem realizar muito mais trabalho do que apenas um ou uns poucos. Também, quanto mais sacerdotes habilitados a Igreja tiver, tanto maior será a totalidade das boas qualidades que podem ser conjugadas para a promoção de seus interesses espirituais.
A atitude correta para com deixar outros compartilhar os privilégios foi expressa por Moisés, quando ele disse a Josué: Tens ciúmes em meu lugar? Não; quisera eu que todo o povo de Deus fosse profeta, porque Deus poria seu Espírito sobre eles! Núm. 11,29.
Deixar de mostrar esta atitude pode levar a sérias conseqüências. Durante o tempo de seu ministério terrestre, Jesus Cristo tornou isto muito claro aos seus apóstolos. Quando certo homem, evidentemente capacitado pelo Espírito de Deus, expulsou demônios à base do nome de Jesus, o apóstolo João e outros tentaram impedi-lo, porque não os acompanhava. Parece que achavam que este homem não fazia parte de seu grupo exclusivo e que sua realização de milagres, portanto, detraía da atividade deles. Quando Jesus soube disso, corrigiu-os. Depois acrescentou um forte aviso: Quem fizer tropeçar a um destes pequenos que crêem, melhor lhe seria que se lhe pusesse em volta do pescoço uma mó daquelas que o burro faz girar e que fosse realmente lançado no mar. (Mar. 9,38-42) Sim, tal atitude egocêntrica, conforme expressa pelos apóstolos, poderia ter levado os novos e humildes a tropeçar. Deus não faria pouco caso de tal proceder prejudicial.
Se desejarmos ter uma condição aprovada perante Deus, deveremos reconhecer a inveja pelo que é um pecado contra Deus e o próximo, sim, a expressão dum espírito desamoroso. Em vista dos maus frutos que a inveja produz, temos bons motivos para odiá-la. Este ódio pode proteger-nos contra nos tornarmos invejosos e contra criarmos competição e inveja nos outros.
A língua hebraica tem apenas um radical para ciúme e zelo. Referindo-se a humanos pecadores, certas palavras hebraicas com esta derivação podem ser traduzidas inveja ou rivalidade. (Gênesis 26,14; Eclesiastes 4,4) A língua grega, porém, tem mais de uma palavra para ciúme. A palavra zélos, assim como a sua equivalente hebraica, pode referir-se tanto ao ciúme próprio (zelo pelo que é certo) como ao ciúme impróprio (característica da pecaminosidade). Outra palavra grega, fthónos, tem um sentido puramente negativo. Em algumas versões bíblicas, ela é sempre traduzida inveja.
Como a palavra fthónos era usada no grego antigo? The Anchor Bible Dictionary declara: Dessemelhante do homem ganancioso, o homem afligido por fthonos não necessariamente quer os bens que uma outra pessoa possui, fato que lhe causa despeito; ele simplesmente não quer que essa pessoa os possua. Ele difere do homem competitivo no sentido de que seu objetivo, dessemelhante daquele do homem competitivo, não é vencer, mas impedir que outros vençam.
O invejoso muitas vezes nem se dá conta de que sua própria atitude é a causa principal dos seus problemas. Uma das particularidades de fthonos, explica o mesmo dicionário, é a falta de conhecimento de si próprio. O homem fthoneros, quando exortado a justificar sua conduta, dirá sempre a si mesmo e aos outros que as pessoas a quem ele ataca merecem isso e que a situação injusta é que o induz a criticar. Quando lhe perguntam como ele consegue falar dum amigo desse jeito, ele diz que sua crítica visa os melhores interesses do amigo.
O erudito bíblico Albert Barnes, do século 19, escreveu a respeito da inveja: É uma das manifestações mais comuns de iniquidade e mostra claramente a profunda depravação do homem. Disse ainda: Quem remontasse à origem de todas as guerras, e contendas, e planos do mundo todas as tramas e objetivos, mesmo de professos cristãos, que contribuem tanto para macular sua religião e dar-lhes uma mentalidade mundana ficaria surpreso de descobrir quanto a inveja teve parte nisso. Dói-nos ver pessoas mais prósperas do que nós; queremos ter aquilo que os outros possuem, embora não tenhamos direito de fazer isso; e isso leva a diversas atuações culpáveis, usadas para diminuir o usufruto que eles têm dessas coisas, ou para nós mesmos as obtermos, ou para mostrar que eles não possuem tanto quanto se supõem que tenham. . . . porque assim se agradará o espírito de inveja no nosso íntimo. Romanos 1,29; Tiago 4,5.
Em contraste, Barnes fez uma declaração interessante a respeito do amor, que não é invejoso. (1 Coríntios 13,4, Imprensa Bíblica Brasileira) Ele escreveu: O amor não inveja a felicidade que os outros têm, deleita-se com o bem-estar deles; e, ao passo que a felicidade deles é aumentada . . ., os que são influenciados pelo amor . . . não a diminuiriam; não os embaraçariam por terem essas posses; não minariam essa felicidade; não murmurariam, nem se lamentariam por não ser tão altamente favorecidos. . . . Se amássemos os outros se nos alegrássemos com a sua felicidade, não os invejaríamos.
Mateus e Marcos, escritores de Evangelhos, usam a palavra grega fthónos para descrever a motivação dos responsáveis pelo assassinato de Jesus. (Mateus 27,18; Marcos 15,10) Sim, estes foram induzidos pela inveja. A mesma emoção prejudicial faz com que os apóstatas se tornem ferrenhos odiadores dos que antes eram seus irmãos. (1 Timóteo 6,3-5) Não é de admirar que homens invejosos sejam impedidos de entrar no Reino de Deus! Deus decretou que todos os que continuam a estar cheios de inveja . . . merecem a morte. Romanos 1,29, 32; Gálatas 5,21.