A que espécie pertence o embrião humano?

O Supremo Tribunal Federal (STF) realizou na sexta-feira, dia 20 de abril, a sua primeira Audiência Pública, e senti-me muito honrada de estar entre os especialistas que foram consultados. Louvo e agradeço a atitude do Ministro Carlos Ayres Britto, ao abrir-nos esse espaço democrático. O respeitoso e excelente embate científico que se travou na Audiência mostrou a sua utilidade e mesmo necessidade.

Está em discussão no STF, por iniciativa da Procuradoria Geral da República (PGR), um tema tão importante quanto espinhoso, tão delicado quanto controverso: os direitos do ser humano em seus primeiros estágios de vida.

Os membros da PGR e os Ministros do STF possuem, amplamente, a necessária competência para avaliar os aspectos éticos e jurídicos da questão. Coube a nós, os especialistas convidados para a Audiência Pública, embasá-los com os aspectos biológicos.

A pergunta que nos foi feita pelo STF foi clara: “quando se inicia a vida humana?” Igualmente clara, e fundamentada cientificamente, foi a resposta dada pelos que integrávamos o grupo convidado pela PGR: cada vida humana inicia-se com a fecundação.

É interessante notar que, embora essa fosse a pergunta central, muitos dos que se posicionaram a favor do uso de células-tronco embrionárias abstiveram-se de respondê-la, não fazendo qualquer menção a ela. E, entre os que a mencionaram, alguns trataram o assunto como “insolúvel” ou referiram que “poderíamos discutir aqui dias sem chegar a uma conclusão”.

Se analisarmos historicamente, veremos que a dúvida sobre a “humanidade” do embrião em seus primeiros dias só surgiu depois que ele começou a ser obtido in vitro. Mesmo depois disso, os livros de embriologia são praticamente unânimes em manter a fecundação como o momento inicial da vida, o que está plenamente justificado por formar-se, nesse processo, um indivíduo humano único e irrepetível, com uma carga genética que se expressará em todas as suas células, sendo mantida até o final da sua vida.

O verdadeiro debate é ético e jurídico, não biológico. O que está em questão não é se esse indivíduo é humano, como pretendem alguns. Como questionei em minha apresentação, “se o embrião não é humano, a que espécie pertence?” Foi uma pergunta que não obteve resposta.

O que está em questão é se todos os indivíduos humanos, mesmo que microscópicos, possuem a mesma dignidade e os mesmos direitos. Transformando a questão em biológica, poderíamos ter para ela uma solução técnica. Mas fica evidente que essa solução técnica não existe. O problema é ético, e assim tem de ser encarado. Somente assim poderá haver clareza sobre os princípios e valores que estão sendo debatidos e sobre as possíveis conseqüências, atuais e futuras, das decisões que, como sociedade, tomarmos.

Seja qual for o veredicto do STF, penso que a Audiência Pública trouxe uma grande contribuição para que o debate fosse colocado nos termos adequados. E demonstrou que esse recurso democrático tem enorme potencial para embasar os grandes debates da nação.

Fonte: UnB Agência – http://www.unb.br/acs/unbagencia/ag0407-45.htm

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