Por Paulo Sérgio

Quanto mais estudo a história da Igreja, mais distante fico em períodos de crise de posições seguras, que envolvam justamente a matéria da crise, chamo isso de continuísmo crítico. Uma vez me perguntaram, como eu conseguia conciliar a minha admiração por Monsenhor Lefebvre e São João Paulo II, como se fossem casos sem precedentes na história. Mas o estudo te dá um pragmatismo para interpretar a situação sem ”paixões”, como a maioria dos continuístas apaixonados. Mais que tudo, creio que Monsenhor Lefebvre seja santo, única e simplesmente porque ele seguiu a sua consciência num nível heróico, no meio da confusão. Houve precedentes? talvez, sim! E não falarei da história controversa de Santo Atanásio, até porque não acredito que São Libério tenha decaído.

Porém teve o caso de Santo Hipólito de Roma, que no seu tempo disse coisas absurdas do Papa, isso escandalizaria os apaixonados, pois Hipólito é santo católico e os papas que ele destratou também são santos, ele é venerado no dia 13 de Agosto. Hipólito foi um liderança da Hierarquia da Igreja romana durante o pontificado de São Zephyrinus ( c. 199–217), a quem ele atacou como sendo modalista (aquele que concebe que todo o Trindade habita em Cristo e afirma que os nomes Pai e Filho são apenas designações diferentes para o mesmo assunto). Hipólito, ao contrário, era um defensor da doutrina do Logos que distinguia as pessoas da Trindade. Ele concebeu Deus como uma unidade que, embora indivisível, era plural. Como a heresia na doutrina dos Modalistas não era claramente aparente a princípio, o Papa Zefirino se recusou a dar uma decisão (não parece muito com o modernismo na atualidade? ainda que não proveniente dos documentos do Concílio?). Por isso Hipólito o censurou gravemente, representando-o como um homem incompetente, indigno de governar a Igreja de Roma e como uma ferramenta nas mãos do ambicioso e intrigante diácono Calisto, cuja juventude é maliciosamente retratada (Philosophumena, IX, xi-xii ). Em ética, ele era conservador e tradicionalista – ficando escandalizado quando Calixto (sucessor de Zefirino) tomou medidas para estender a absolvição a pecados mais graves, como o adultério (alguma coincidência com Amoris Laetiae?) – e considerava a Igreja uma sociedade composta exclusivamente de crentes.

Embora a reputação de Hipólito como estudioso e seu talento literário fossem ativos para sua causa, a igreja escolheu Calixtus para o papado quando Zephyrinus morreu. Em desgosto, Hipólito retirou-se da comunidade romana e liderou um grupo dissidente cismático, sendo feito de diácono a bispo e sem ter tido Sé. Ele viveu em oposição aos sucessivos pontificados dos santos Urbano I (222–230) e Pôncio (230–235), com quem foi exilado nas minas da Sardenha em 235 durante a perseguição aos cristãos pelo imperador romano Maximinus. Lá ele se reconciliou com Pôncio e exortou seus partidários a se unirem a Roma. Antes de morrer como mártires, ambos renunciaram para permitir um sucessor (235-236), encerrando assim o cisma. O Papa São Fabiano (236–250) teve seus cadáveres trazidos a Roma para sepultamento solene.

Em vez de um teólogo original, Hipólito foi um compilador laborioso e erudito, cujos escritos muitas vezes eram prejudicados por um tom amargo e controverso. O Ocidente logo o esqueceu porque ele foi considerado um cismático e porque escrevia em grego. Seu trabalho mais importante é considerado Philosophumena (uma parte de uma obra maior chamada Refutação de todas as heresias ), que procura mostrar que as várias heresias cristãs são rastreáveis ​​a falsas filosofias pagãs (muito parecido com o livro Do Liberalismo a Apostasia). A ordem da igreja, conhecida como Tradição Apostólica (existente apenas em versões posteriores; tradução do inglês por G. Dix, 1937), é agora geralmente atribuída a ele e ilumina os ritos e liturgias em uso em Roma no início do século III D.C.

Lembro que após a morte de Monsenhor Lefebvre, São João Paulo II não emitiu nenhuma condenação, no seu pontificado a Congregação para Doutrina da Fé em nota admitiu que nenhum dos fiéis que iam a FSSPX eram cismáticos per si. O New York Times diz que o comunicado do Vaticano acrescentou que, ao saber da morte do arcebispo, o Papa fez uma oração “confiando a alma do falecido à misericórdia de Deus.”

Dentro desse contexto, é possível sim admirar as virtudes de Monsenhor Lefebvre e ao mesmo tempo venerar São João Paulo II e suas virtudes, sem fechar os olhos para os seus excessos de boa fé, de ambas partes. Hipólito apesar de sua reconciliação não morreu plenamente admitido em Roma, muito pelo contrário, e grande parte da sua memória é de resistência, tanto que pouco de seus escritos foram preservados. Isso é comum num contexto normal? não, isso só existe num contexto de excessão, de crise, de perseguição, como tudo que é exceção à regra.

Ainda assim, isso me gerou certa paz de consciência, um tapa-buraco, até que tudo seja resolvido, todas as soluções que damos para a consciência num período de crise, é puramente uma solução meia-boca, como é meia-boca a maioria dos argumentos que vejo por ai.

Fonte: Facebook.

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