O Primado de Pedro e os Ortodoxos

Por Pe. Ray Ryland

Tradução: Carlos Martins Nabeto

O fato da mútua excomunhão entre católicos romanos e ortodoxos ter sido levantada em 1965 não significa que de lá para cá o diálogo ecumênico entre eles e nós seja fácil, dadas as doutrinas que nos unem. Um dos pontos mais controversos para a unidade continua sendo o que diz respeito à jurisdição do Papa de Roma sobre toda a Igreja universal, isto é, não só em relação ao Ocidente como também ao Oriente – que os ortodoxos negam veementemente. No entanto, a Igreja Católica não é formada somente pela Igreja romana, mas ainda por outras 23 Igrejas de ritos orientais, que estão em plena comunhão com o Bispo de Roma e aceitam a sua jurisdição, tendo a maioria delas regressado à comunhão após um bom período de afastamento. Essas Igrejas, chamadas pejorativamente de “uniatas” pelos ortodoxos, por reconhecerem a autoridade do Papa, como se fosse uma união espúria e provocadora, são na verdade um grande exemplo do antigo entendimento de como o mundo cristão sempre reconheceu no Papa a autoridade suprema que Cristo confiou a Pedro. Veja-se, p.ex., este estudo publicado na página da Igreja Católica Bizantina no FB:

– “Os Concílios de Arimino e Selêucia e a Jurisdição Universal do Bispo de Roma

Em 358 foram celebrados Concílios no Ocidente (em Arimino, atual Rimini, na Itália) e no Oriente (em Selêucia, na Ásia Menor). O legado do Papa presidiu a abertura do Concílio de Arimino, em que estiveram presentes mais de 400 Bispos. O Concílio excomungou os hereges [arianos] que pertubavam a Igreja. Com a confirmação do Papa, este Concílio poderia ter se convertido em ecumênico, no entanto o imperador tomou o controle e o legado papal abandonou o Concílio. A seguir, o imperador obrigou aos Bispos restantes a assinarem um Credo herético. 

As coisas não correram melhor no Concílio da Selêucia: ali os Bispos se submeteram à vontade do imperador e firmaram o mesmo Credo herético exigido aos Bispos de Arimino. No fim, somente 18 ou 19 Bispos em toda Cristandade permaneceram fiéis à fé de Niceia. Deste modo, Jerônimo escreveu posteriormente: ‘O mundo inteiro gemeu de assombro ao se ver ariano’.

Atanásio, Eusébio, Hilário, todos os Bispos fiéis e todos os exilados não firmaram o Credo herético, porém coube ao Papa Libério repudiar a fórmula. E como a repudiou, o imperador o enviou para o exílio. Uma vez que Jesus havia confiado a Pedro e seus sucessores a tarefa de ‘fortalecer os irmãos’, *prevaleceu* o repúdio do Papa. Coube a Dâmaso, sucessor de Libério, tornar finalmente efetivo o repúdio papal a Arimino. 

Sabemos por Atanásio que no Oriente havia uma grande ansiedade em relação aos Concílios de Arimino e Selêucia. Basílio descreveu em detalhes a angústia criada pela deserção da maioria dos Bispos quanto a heresia ariana. E apelou para o Papa, desesperado. Mais tarde, disse que tinha escrito ao Bispo de Roma pedindo para que este ‘supervisionasse (esta a fórmula verbal da palavra ‘bispo’) os assuntos aqui no Oriente e ditasse sentença, para que pudesse atuar por sua própria autoridade no assunto e escolher homens à altura da tarefa’. Assim, o que Basílio realmente disse foi: ‘Não podemos vencer esta heresia. Tu possuis autoridade! Usa ela!’

Observemos o que Basílio requer: a tarefa dos legados papais, pela qual advoga para persuadir os Bispos orientais, para que aceitem a anulação dos Concílios de Arimino e Selêucia por parte do Papa. Atualmente os orientais afirmam que os Bispos orientais sempre rejeitaram qualquer noção de jurisdição papal universal, contudo Basílio jamais teria instado um procedimento baseado num princípio negado pelos Bispos orientais!

Mas concedamos por um momento a afirmação ortodoxa de que os Bispos orientais não aceitavam a jurisdição papal universal… se isso fosse verdade, a resposta ao plano de Basílio seria óbvia, se fosse levado a efeito: declarariam que o Bispo de Roma não tinha autoridade para enviar legados para garantir a aceitação da sua decisão. No entanto, não devemos esquecer que Basílio era um teólogo destacado e prelado oriental; sabia muito bem o que seus companheiros Bispos aceitariam ou não. Mediante sua solicitação, reconheceu que Roma podia (e o fez!) exercer legitimamente sua jurisdição sobre o Oriente. Estava seguro de que seus companheiros prelados reconheceriam essa jurisdição. 

Dâmaso dirigiu uma carta aos Bispos da Ilíria e, através deles, a todos os Bispos orientais. Assegurou-lhes que não deviam se alarmar pelo grande número de Bispos que caíram na heresia em Arimino; nestes assuntos, os números são irrelevantes – afirma Dâmaso – ‘porque é evidente que nem o Bispo Romano [Libério], cujo juízo era o que se buscava perante todos, nem Vicente, nem outros, ofereceram qualquer consentimento a tais decretos’. Dâmaso recordava aos Bispos orientais que a negativa de Libério a confirmar a fórmula ariana ‘ipso facto’ anulava ‘ipso facto’ a ação dos Bispos hereges. 

Ninguém se opôs a esta recordação!

Em sua carta, Dâmaso relembra o trabalho do Concílio de Niceia: ‘Nossos antepassados, 318 Bispos, dirigidos a partir da cidade do santíssimo Bispo da cidade de Roma, tendo se reunido em Concílio em Niceia, ergueram este baluarte contra as armas do diabo’.

Consideremos estes fatos: nem o Concílio de Niceia, nem o seu Credo puderam garantir a ortodoxia; poucos anos após o Concílio surgiram novas formas de arianismo no Oriente. O Concílio não podia interpretar seus próprios cânones; portanto, o Concílio não podia garantir seus próprios cânones! É evidente que um Concílio como tal não pode funcionar como Magistério.

Conforme o plano de Cristo, ‘o governo ordinário da Igreja não está nos Concílios gerais, mas nos Bispos em união com a Santa Sé. Era para Roma que os homens angustiados daqueles dias olhavam; não para os Concílios gerais. Em um sentido, de fato, os olhos de todos estiveram por algum tempo voltados para o grande Bispo de Alexandria; contudo, o próprio Santo Atanásio voltou o seu olhar para Roma’.

O conciliarismo defendido pelos apologistas ortodoxos orientais como alternativa à autoridade papal é tão somente uma teoria. Não pode substituir o Papado porque o Papado é o plano de Deus para a sua Igreja. 

A fórmula da História é simples: 

Concílio – Papado = Caos”

(Pe. Ray Ryland, doutor em Teologia pela Universidade de Marquette e licenciado em Direito oela Universidade de San Diego; fonte: Página da Iglesia Católica Bizantina no FB; tradução livre: CMN).

Fonte: https://www.facebook.com/carlosmartins.nabeto

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