- Autor: São Tomás de Aquino
- Fonte: Suma Teológica, Parte III, Questão 66
- Tradução: Dercio Antonio Paganini
Objeção 1: Parece que o Batismo pode ser reiterado. O Batismo foi instituído para lavar os pecados, mas os pecados são reiterados, assim sendo, muito mais precisa o Batismo ser reiterado, pois a benevolência de Cristo supera a ganância humana.
Réplica à Objeção 1: O Batismo obtém sua eficácia da Paixão de Cristo como ficou estabelecido antes (arts. 2 e 1). Todavia, os pecados subsequentes não invalidam a Paixão de Cristo, então também não cancelam o Batismo para que seja feita sua repetição. Por outro lado, o pecado que impedisse o efeito do Batismo poderia ser eliminado pela Penitência.
Objeção 2: Efetivamente João Batista recebeu uma recomendação especial de Cristo, O Qual disse a ele em Mt 11,11: “Em verdade vos digo que, entre os nascidos de mulher, não surgiu outro maior que João, o Batista; mas aquele que é o menor no reino dos céus é maior do que ele”. Mas aqueles que foram batizados por João, foram batizados novamente, conforme Atos, 19,1-7: “E sucedeu que, enquanto Apolo estava em Corinto, Paulo tendo atravessado as regiões mais altas, chegou a Éfeso e, achando ali alguns discípulos, perguntou-lhes: ‘Recebestes vós o Espírito Santo quando crestes?’ Responderam-lhe eles: ‘Não, nem sequer ouvimos que haja Espírito Santo’. Tornou-lhes ele: ‘Em que fostes batizados então?’ E eles disseram: ‘No batismo de João’. Mas Paulo respondeu: ‘João administrou o batismo do arrependimento, dizendo ao povo que cresse naquele que após ele havia de vir, isto é, em Jesus’. Quando ouviram isso, foram batizados em nome do Senhor Jesus. Havendo-lhes Paulo imposto as mãos, veio sobre eles o Espírito Santo, e falavam em línguas e profetizavam. E eram ao todo uns doze homens.” Muitos mais, como esses foram rebatizados pois haviam sido batizados por hereges ou pecadores.
Replica à Objeção 2: Como diz Agostinho baseado em João 1,33: “‘Eu não o conhecia; mas o que me enviou a batizar em água, esse me disse: Aquele sobre quem vires descer o Espírito, e sobre ele permanecer, esse é o que batiza no Espírito Santo’ – Estejam certos de que, quando João administrava o seu Batismo, esse Batismo era válido, mas se um criminoso administrasse o Batismo de João, esse Batismo não seria válido, porque João dava seu próprio Batismo; Depois da morte de Cristo, e por isso mesmo, o sacramento é tão sacro que nem mesmo a administração por um assassino pode contaminá-lo.”
Objeção 3: No Concílio de Nicéia (Cânon XIX) foi dito que se “Qualquer dos Paulianistas ou Catafígios for convertido à Igreja Católica, eles precisarão ser batizados”, e a mesma coisa se pode dizer em relação a outros hereges. Assim sendo, aqueles a quem os hereges batizaram, precisarão ser batizados novamente.
Réplica à Objeção 3: Os Paulianistas e os Catafrígios não usam batizar em nome da Trindade. Todavia, Gregório escreveu ao Bispo Quírico dizendo: “Aqueles hereges que não são batizados em nome da Trindade, como os Bonosianos e Catafrígios” (que são do mesmo pensamento dos Paulianistas), “então o autor não acredita que Cristo é Deus” (afirmando que Ele é um mero homem) “além de que os últimos (Catafrígios), são tão perversos que, como diz Montano, confundem um mero homem com o Espírito Santo; portanto, todos eles deverão ser batizados caso venham para a Santa Igreja, pois o batismo que receberam naquele estado de erros não foi um Batismo verdadeiro, pois não foi conferido em nome da Trindade.” Por outro lado, como ficou determinado em De Eclesiam, Dogma XXII: “Aqueles hereges que foram batizados confessadamente em nome da Trindade, poderão ser recebidos na Fé Católica como realmente batizados.”
Objeção 4: O Batismo é necessário para a salvação, mas algumas vezes existe dúvida a respeito do batismo de algumas pessoas; então, parece necessário batizá-las novamente.
Replica à Objeção 4: De acordo com o Decreto de Alexandre III: “Aqueles cujo Batismo seja duvidoso, deverão ser batizados com estas palavras prefixadas à fórmula: ‘Se você é batizado, eu não o rebatizo, porém, caso você não seja batizado, então eu te batizo em nome do Pai etc.’ e assim jamais ficará repetido o Batismo.”.
Objeção 5: A Eucaristia é um sacramento mais perfeito que o Batismo, como estabelecido acima (perg. 65, art. 3), e mesmo assim, a Eucaristia é muitas vezes repetida; então, com muito maior razão o Batismo pode ser reiterado.
Replica à Objeção 5: Ambos os sacramentos, tanto Batismo como Eucaristia são uma representação da Paixão e Morte de nosso Senhor, mas não da mesma forma. Enquanto o Batismo é uma comemoração da morte de Cristo na qual um homem morre com Cristo, e pode nascer novamente em uma vida nova, a Eucaristia é uma comemoração da morte de Cristo, a qual sofrida por Ele Mesmo é oferecida a nós como o banquete Pascal, de acordo com 1Cor 5,7-8: “Expurgai o fermento velho, para que sejais massa nova, assim como sois sem fermento. Porque Cristo, nossa páscoa, já foi sacrificado. Pelo que celebremos a festa, não com o fermento velho, nem com o fermento da malícia e da corrupção, mas com os ázimos da sinceridade e da verdade.” E enquanto o homem nasce novamente quando ele come muitas vezes, assim o batismo lhe é dado uma vez, mas a Eucaristia lhe é dada freqüentemente.
Pelo contrário, está escrito (Ef 4:5): “uma fé, um Batismo”.
Eu respondo que o Batismo não pode ser reiterado: Primeiro: porque o Batismo é uma regeneração espiritual, pela qual a pessoa morre para uma antiga vida e começa a viver uma nova. Também está escrito em João 3,5: “Se a pessoa não renascer pela água e pelo espirito Santo, ela não poderá entrar no reino do Deus”; e, uma pessoa pode renascer apenas uma vez. Assim sendo, o Batismo não pode ser reiterado, da mesma forma que a geração carnal. Todavia, Agostinho, baseado em João 3,4: “como pode uma pessoa entrar no ventre de sua mãe e nascer novamente”, diz: “precisa ser entendido o nascimento do Espírito, como Nicodemos entendeu o nascimento da carne… então, como na carne não haverá o retorno ao ventre da mãe, da mesma forma, não pode haver um segundo Batismo.”
Segundo: porque “nós somos batizados na morte de Cristo”, pela qual, morremos para o pecado e vivemos novamente em “novidade de vida” (Rm 6,3-4: “Ou, porventura, ignorais que todos quantos fomos batizados em Cristo Jesus fomos batizados na sua morte? Fomos, pois, sepultados com ele pelo batismo na morte, para que, como Cristo foi ressuscitado dentre os mortos pela glória do Pai, assim andemos nós também em novidade de vida.”). Então, “Cristo morreu”, mas “apenas uma vez” (Rm 6,10: “Pois quanto a ter morrido, de uma vez por todas morreu para o pecado, mas quanto a viver, vive para Deus.”). Assim sendo, o Batismo não pode ser reiterado. Por esta razão, (Hb 6,4-6: “Porque é impossível que os que uma vez foram iluminados, e provaram o dom celestial, e se fizeram participantes do Espírito Santo, e provaram a boa palavra de Deus, e os poderes do mundo vindouro, e depois caíram, sejam outra vez renovados para arrependimento; visto que, quanto a eles, estão crucificando de novo o Filho de Deus, e o expondo ao vitupério.”) é dito que os que desejam batizar-se novamente estarão “crucificando novamente o Filho de Deus”, e portanto, “uma morte de Cristo significa um só Batismo”.
Terceiro: porque o Batismo imprime um caráter indelével, e é conferido com uma certa consagração. Portanto, como outras consagrações, não são reiteradas na Igreja, assim também não o é o batismo. Esta é a visão expressa por Agostinho que diz (Contra Epist. Parmen. II) que “o posto militar não é renovado”, e que “o sacramento de Cristo não é menos duradouro que esta condecoração corporal, então podemos ver que nem mesmo os apóstatas serão desprovidos do Batismo, e portanto, se eles se arrependerem e voltarem à Igreja, não serão batizados novamente”.
Quarto: porque o Batismo é conferido principalmente como um remédio contra o pecado original, e portanto, como o pecado original não pode ser renovado, então o Batismo também não pode, e também está escrito em Rm 5,18: “Portanto, assim como por uma só ofensa veio o juízo sobre todos os homens para condenação, assim também por um só ato de justiça veio a graça sobre todos os homens para justificação e vida”.