Evangelho de marcos iii

Evangelho de Marcos III


Mensagem e conteúdo Doutrinal

A principal particularidade de Marcos consiste em situar o leitor diretamente perante Jesus Cristo, apresentando-nos, sem desenvolvimentos explicativos, os episódios mais importantes da sua vida e até deixando de lado , ao contrário dos outros Evangelhos, os discursos e conjuntos de palavras de Jesus (particularidade de Mateus), ou de reflexões teológicas acerca dele (particularidade de João). Marcos deixou-nos um fruto diferente, mas talvez não menos saboroso: a vivacidade na descrição do comportamento de Jesus com os seus discípulos e com as demais pessoas com as quais se cruzou na sua vida terrena.


Assim , por exemplo, a filiação divina de Jesus é revelada muito mais no exercício do seu poder divino do que por meio de afirmações dogmáticas: exemplo : perdão dos pecados( 2,10-22) e autoridade sobre o sábado (2,28; 3,15) a expulsão dos demônios (1,28.34; 3,11)o conhecimento dos segredos mais íntimos (2,8; 8,17; 12,15) as predições (8,31ss;10,39; 13,1ss). Marcos apresenta apenas dois discursos: 4,1-34 e 13,1-37. Diz freqüentemente que Jesus ensinava, mas não registrou o ensinamento. A sua narração concentra-se não só nas ações de Jesus expostas com mais minúcias do que Mateus ou Lucas, mas também na pessoa de Jesus e as reações do povo à sua pessoa.

Outra particularidade é a de sublinhar a tensão de todo o seu Evangelho em relação à Paixão e Morte de Jesus. Não que esta tensão não exista nos outros Evangelhos, mas sim que em Marcos está acentuada de modo especial.


Com relatos tão vivos, o evangelista consegue o seu propósito de deixar na nossa alma a atração, simultaneamente deslumbrante e serena, de Jesus Cristo, algo do que os Apóstolos deviam ter sentido no seu convívio com o Mestre. Na verdade, ele transmite-nos o que São Pedro explicava com a profunda emoção que não passa com os anos, mas se torna cada vez mais profunda e consciente, mais penetrante e afetuosa, mais cheia de um amor que vai amadurecendo com o tempo. Podemos afirmar que a mensagem de Marcos é o espelho vivo da pregação de São Pedro, da qual São Lucas nos transmitiu também uns resumos fiéis nos discursos dos Atos dos Apóstolos.

Seu tema essencial é a manifestação do Messias crucificado. Por um lado, mostra em Jesus o Filho de Deus, reconhecido como tal pelo Pai, pelos demônios e até pelos homens. O Messias que reivindica para si uma condição divina (14,62)., superior aos anjos (13,32), atribui a si o poder de perdoar os pecados (2,10), prova seu poder e sua missão por meio de milagres e exorcismos.


Mas , por outro lado, sublinha fortemente seu aparente fracasso junto aos homens: escândalo do povo (5,40; 6,2s), hostilidade dos chefes judeus (3,6) incompreensão dos próprios discípulos (4,13) oposições que conduzem à cruz. É esse escândalo o que Marcos quer explicar não só contrapondo-lhe o triunfo final da ressurreição., mas mostrando que assim devia suceder segundo os misteriosos desígnios de Deus. Era necessário que Cristo sofresse para resgatar os homens, estava anunciado pelas Escrituras (9,22; 14,21.49) e o próprio Jesus proclamou esse caminho de humildade e de sofrimento para si mesmo. Todavia a expectativa judaica de um Messias guerreiro e vitorioso estava pouco disposta a admitir essa solução de dor e abnegação, por isso, cerca de silêncio seus milagres.


A pergunta chave e que constitui o centro do Evangelho de Marcos é: Quem é Jesus ? Quem é o discípulo? Por isso o Evangelho move-se nestas duas linhas paralelas: a revelação do mistério de Jesus e a manifestação a seus discípulos.


A confrontação entre essas duas linhas converte Marcos num Evangelho atual que se interpela a cada um.


O homem vê os gestos de Cristo, ouve suas palavras, mas não compreende, continua incrédulo; os motivos dessa cegueira são diversos, mas todos procedem de um coração impuro (7,17-23). Trata-se de obstáculos que devem ser superados, algo muitas vezes impossível para o homem mas sempre possível para Deus (10,26s) Marcos quer dar a verdadeira identidade de Jesus e o faz nas primeiras palavras de seu Evangelho : Jesus é o Messias Salvador por meio de seu sofrimento e de sua cruz. O discípulo só chegará à glória depois de carregar a cruz.(8,34-35; 9,42-48; 10.28-31.35-45)A vida não termina aqui, mas sim no triunfo da Páscoa. O Evangelho tem como cume a Paixão, Morte e Ressurreição de Jesus.


Quem é o discípulo de Cristo ? Em 1,16-20 temos o relato do chamado dos primeiros discípulos. A iniciativa parte de Jesus, diferentemente dos sábios que eram procurados por seus alunos. Eles são chamados a “seguir” não a “aprender” . São chamados a percorrer o caminho do Mestre. Isto porque em primeiro lugar não está a doutrina mas uma Pessoa. O chamado não é apenas para uns poucos escolhidos “A seguir ele convocou a multidão , com seus discípulos, e lhes disse: Se alguém quer vir em meu seguimento, renuncie a si mesmo tome a sua cruz e siga-me.” (8,34)


Podemos esquematizar a mensagem evangélica em três etapas:
Na primeira etapa (caps.1-8), os leitores de Marcos são atraídos a um relacionamento com o poderoso pregador e autor de curas, Jesus de Nazaré. Durante esta etapa ninguém parece entender a verdadeira identidade de Jesus, nem mesmo seus discípulos. De repente, no encontro em Cesareia de Filipe, torna-se claro: “era necessário que o Filho do Homem sofresse muito… fosse morto e, três dias depois ressuscitasse (8,31). Ainda que Jesus explicasse continuamente os seus discursos e prodígios ao círculo mais restrito dos seus colaboradores (4,33s) os apóstolos e discípulos não conseguiam compreender a obra, a mensagem e o próprio caminho de Jesus rumo à cruz. Eles só chegaram ao conhecimento da messianidade e da divindade de Jesus depois da ressurreição e do envio do Espírito Santo. Já os leitores do Evangelho aprendem que o caminho de Cristo é o caminho do cristão, e este é o caminho da cruz.(8,34).


A segunda etapa (caps. 9-15) aos poucos revela aos leitores os meios concretos do verdadeiro discipulado cristão, em 10,45 Jesus diz : “Pois o Filho do Homem veio, não para ser servido, mas para servir e dar a vida em resgate pela multidão”. É precisamente isso o que acontece no segundo clímax do Evangelho, quando Jesus morre por seu povo.(caps. 14-15).


A terceira etapa começa com a proclamação da ressurreição de Jesus e sua ida à Galileia, precedendo os discípulos (16,6-7).


Marcos desafia os leitores da maneira mais dramática a responder a Jesus em suas vidas com confiança e não trêmulos e transtornados como as mulheres no sepulcro. Esta terceira etapa continua na vida da Igreja, até que o Senhor ressuscitado volte.

Marcos acredita que o sinal mais verdadeiro de que se é discípulo de Jesus é a confiança. Exorta os leitores a uma fé radical no Senhor ressuscitado de uma forma muito estimulante, descrevendo os primeiros discípulos de Jesus como obtusos, cegos. Eles respondem com espanto e medo ao que Jesus faz.
Não conseguem vê-lo como o Servo sofredor, que lhes dá vida por intermédio de sua morte (10,35-45).O Jesus que podia dar visão aos cegos fisicamente (8,22-26; 10,46-52) não conseguia dar discernimento e compreensão a seus discípulos mais íntimos.

A cegueira dos discípulos é um dos fios trágicos da narrativa de Marcos. Ao apresentá-los dessa maneira, entretanto, Marcos espera que seus leitores cristãos vejam melhor do que os primeiros discípulos de Jesus. . Espera que eles confiem em Jesus não como o “Messias que cura instantaneamente”, mas como aquele cuja morte dá sentido à vida e ao sofrimento que sentem. Seus primeiros leitores sofriam as perseguições do Império Romano.


Marcos relaciona de maneira muito bonita Jesus com os lugares em que viveu, assim Sua vida é enquadrada em três grandes cenários: o deserto, o mar da Galileia e o caminho.
Deserto: início da vida pública de Jesus. É um lugar paradoxal de intimidade com Deus e da tentação. Lá João Batista se preparou pra a sua vida profética.


Mar da Galileia: mar é símbolo de vida mas também perigo e ameaça quando sopram ventos fortes.Em torno do mar Jesus chama discípulos, cria sua comunidade, alimenta-se com a palavra , exemplo, feitos.


Caminho: aponta para a frente. Marcos apresenta-nos Jesus a andar. Não pára.


Alguns textos

Conclusão: 16,9-20 Esta passagem está ausente nos manuscritos mais importantes. Seu conteúdo, forma e estilo são distintos do resto do Evangelho. Parece tratar-se de um resumo e uma harmonização das aparições relatadas em Mateus, Lucas e João. Não seria portanto do mesmo autor do resto, seria um acréscimo posterior. Geralmente se admite que a conclusão foi acrescentada para corrigir o final abrupto do livro no versículo 8.

 

Mas nunca saberemos se a conclusão original do livro foi perdida ou se Marcos julgou que a referência à tradição das aparições na Galileia no versículo 7 bastava para encerrar sua narrativa. De todo modo o trecho pertence ao texto canônico e portanto inspirado por Deus.


Eis as principais perícopes próprias de Marcos:

3,20 – providências da família de Jesus

4,26-29 – Parábola da semente que germina por si só.

7,32-37 – Cura do surdo gago.

8,22-26 cura de um cego em Betsaida.


Marcos é, sem dúvida, um evangelho de vida e esperança, obtidas, contudo, depois da cruz e por meio dela.


O livro não é todo o Evangelho, mas apenas o inicio cf. 1,1 “Principio do Evangelho de Jesus Cristo, Filho de Deus” , ou seja a vida terrena de Jesus. O prosseguimento diz respeito à nossa vida, como discípulos que O seguimos . É a Igreja quem continua a viver o Evangelho no decorrer dos séculos.


Que o Evangelho de Marcos nos incentive a seguir os passos de Jesus que estava sempre a caminho conforme os desígnios do Pai.

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